QUEM FINANCIA A DESTRUIÇÃO DA FLORESTA AMAZÔNICA PELOS GARIMPEIROS E GRILEIROS? POR CARLOS WAGNER*
- Alexandre Costa

- 24 de nov.
- 5 min de leitura

COP30 lançou luzes sobre as ações do crime organizado no meio ambiente Foto: EBC
A 30ª Conferência da ONU sobre Mudança Climática (COP30) deixou vários e importantes legados para o mundo. Aconteceu entre os dias 10 e 21 de novembro em Belém (PA), no meio da Floresta Amazônica. Jornalistas têm muito trabalho pela frente para ler e entender os relatórios dos debates entre cientistas, líderes mundiais, organizações não governamentais e o público, em especial os jovens. Vamos conversar sobre um destes legados.
Vou focar sobre o legado de ter apontado o crime organizado como um dos responsáveis pela depredação da Floresta Amazônica e de suas populações. Ao financiar e dar proteção a garimpeiros, madeireiros ilegais e grileiros de terras, as organizações criminosas deixam um rastro de mortes e destruição. Vou citar dois episódios para ilustrar o assunto. Considero necessário alertar o leitor sobre o conhecimento que tenho a respeito do que vou falar. Como repórter, andei, ando e vou continuar a andar pelos rincões do Brasil em busca de histórias para contar. Conheço bem a Floresta Amazônica e seus povos. Lembro que durante o governo (2019 – 2022) do presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, deliberadamente as agências governamentais de fiscalização ambiental, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), foram boicotadas e sofreram cortes nas suas verbas. O afrouxamento da fiscalização resultou na invasão em massa de garimpeiros nas reservas indígenas e o aumento do número de madeireiros ilegais e de grileiros ocupando áreas públicas. Foi uma farra. A história desta farra é contada em diversos processos tramitando nos tribunais brasileiros e internacionais responsabilizando o governo Bolsonaro pelo caos causado na Amazônia. Esse “salva-se quem puder” atraiu para a região as duas mais poderosas facções criminosas do país: o Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, e o Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo. Na ocasião, a imprensa nacional e internacional abriu nas capas dos jornais a manchete: “O crime organizado chega aos garimpos da Floresta Amazônica”. Na verdade, já estava lá, usando os rios da região para abastecer o Brasil, a Europa e os Estados Unidos com a cocaína produzida na Colômbia, no Peru e na Bolívia. Como disse, foram para o garimpo porque viram uma oportunidade de ganhar e lavar dinheiro.
Entendi essa situação ouvido e prestando atenção às histórias que rolaram durante a COP30. Eu me dei conta do seguinte. Não foram o CV e o PCC que levaram o crime organizado para o garimpo. Muito antes, as organizações criminosas já estavam presentes, financiado a extração do ouro e da bauxita, a derrubada das árvores e a grilagem de terras. O fato é o seguinte. Os garimpeiros não são mais um grupo de homens que entra na mata para arriscar a sorte em busca do ouro. Isso acabou há muito tempo. Lembro que nos anos 90, quando estive na reserva yanomami, uma gleba de 9,6 milhões de hectares na fronteira de Roraima com a Venezuela, muito rica em ouro, bauxita e outros minérios, a atividade garimpeira era assim organizada: um grupo de pessoas fazia uma espécie de cooperativa para arrecadar dinheiro e usá-lo para financiar os garimpeiros, fornecendo-lhes maquinário, alimentação, transporte e proteção armada contra os índios. Em 1993, os garimpeiros massacraram 16 yanomamis na comunidade de Haximu. A história toda foi documentada pelo Ministério Público Federal (MPF). Meses depois das mortes estive na reserva conversando com os chefes yanomamis e o pessoal da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Na capital de Roraima, Boa Vista, falei longamente com os financiadores dos garimpeiros e os chamados “pilotos do garimpo” sobre a organização da atividade garimpeira. Na época, uma boa parte da economia de Boa Vista girava em torno do garimpo. Em 2005, andei pela divisa entre Mato Grosso e Rondônia, na reserva indígena Roosevelt, uma área de 2,7 milhões de hectares onde vivem os índios cinta-larga e muito rica em diamantes e outros minérios. Em abril de 2004, houve um desentendimento entre as lideranças dos índios e um grupo de garimpeiros na disputa por uma “grota”, como são conhecidas as jazidas de diamantes. Houve um confronto e 29 garimpeiros foram mortos. Fiquei umas duas semanas pela região e fiz como base a cidade de Espigão d’Oeste (RO). Conversei com os financiadores dos garimpeiros e chefes indígenas e fiquei surpreso com o número de comerciantes de diamantes estrangeiros andando pela região. Lembro-me que uma liderança indígena reclamou do poder que os financiadores dos garimpeiros tinham, tanto entre os garimpeiros quanto na tribo dos cinta-larga. Por que citei estes dois episódios? Simples. Fiz dezenas de matérias sobre eles e li grande parte das reportagens publicadas sobre o assunto, além dos inquéritos policiais que foram abertos. Apareceram nos jornais os nomes dos garimpeiros e dos líderes indígenas. Mas os nomes dos financiadores não estavam nos noticiários. Por quê? Existe entre nós jornalistas desconhecimento muito grande sobre como funciona a estrutura que dá suporte econômico ao garimpo, à grilagem de terras e à derrubada ilegal das árvores. A maioria dos moradores das cidades isoladas no meio da floresta sabe quem são financiadores. E quais são as regras para ser financiado.
Os financiadores dos garimpos e de outras atividades ilegais na Amazônia ficam fora do radar das autoridades porque funcionam nos moldes de uma organização criminosa. Mas podem ser encontrados, porque, por onde passam, deixam um rastro de miséria, doenças e destruição da floresta. Vou lembrar um fato. No primeiro ano do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 80 anos, foi montada uma grande operação que expulsou centenas de garimpeiros da reserva yanomami. Na ocasião, liguei para um financiador de garimpo que conheço em Boa Vista e ouvi dele: “Tenho mais de 200 garimpeiros parados porque foram expulsos do seu trabalho lá nos yanomami. Isso não é justo”. Como disse, liguei para ouvir a opinião dele e não para discutir a história. Na ocasião, corria o mundo as fotos dos yanomamis que eram só pele e osso devido à fome causada pelo garimpo nas suas terras. A ação do governo diminuiu sensivelmente a atividade de garimpeiros, madeireiros e grileiros. Mas eles ainda estão lá. Atentos aos rumos que as eleições de 2026 irão tomar. É assim que eles agem. Pouco sabemos sobre a atividade do CV e do PCC nos garimpos. E como as duas organizações criminosas estão se relacionando com os financiadores dos garimpeiros. Sabemos que ambas estão investindo muito dinheiro no aperfeiçoamento das suas rotas de cocaína na região. E que os financiadores dos destruidores da Floresta Amazônica se encolheram no seu canto, esperando os resultados das eleições de 2026. É fundamental para nós jornalistas sabermos o que está rolando entre os financiadores, o CV e o PCC para não sermos surpreendidos nem escrever bobagens.








