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Foto do escritorAlexandre Costa

QUATRO ANOS DEPOIS DO GOLPE TRAVESTIDO DE IMPEACHMENT, O BRASIL QUE DERRUBOU DILMA ROUSSEFF AGONIZA


Nesta segunda-feira, dia 31 de agosto, faz quatro anos que Dilma Rousseff foi deposta da Presidência da República por um golpe travestido de impeachment. Dilma foi julgada e afastada sem que pesasse sobre ela qualquer suspeita de enriquecimento ilícito ou de corrupção. Acusada de praticar manobras contábeis, procedimento rotineiro nas administrações de vários presidentes que a precederam, a ex-presidenta foi vítima de um complexo e fraudulento processo parlamentar jurídico e midiático que entrou para a história do Brasil como a mais vergonhosa e degradante farsa da República. Depois de Dilma, o país foi governado pelo seu vice, Michel Temer. Com Jair Bolsonarona na presidência, o Brasil é um país à deriva, que flerta com o fascismo, viola direitos e ameaça a sua própria Constituição.

Foto: Marcos Corrêa/PR

Quatro anos após o golpe, a democracia brasileira agoniza e se debate em praça pública, tentando sobreviver aos ataques contínuos à soberania popular, ao sistema de Justiça e ao desmantelamento do estado. Os retrocessos são evidentes e estão por todos os lados, nas estatísticas, nos percentuais, em indicadores sociais e econômicos e, principalmente, nos recursos e investimentos que incidem na qualidade de vida da população e no desenvolvimento do país. Diante da pandemia do coronavírus, o governo Bolsonaro mergulha em uma crise econômica sem precedentes na história do país.


Para compreender o golpe contra a democracia brasileira, o www.esquinademocratica.com traz à memória fatos importantes da política nacional e que motivaram a farsa do impeachment. O golpe não ocorreu em função das pedaladas fiscais de Dilma tampouco pela tentativa de associar Lula à corrupção, como no caso do triplex ou do sítio de Atibaia. Em 2018, o presidente da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet), Felipe Coutinho, denunciou que a articulação do golpe estava associado a aspectos geopolíticos. O impeachment de Dilma, segundo ele, foi motivado pela acirrada disputa pela propriedade do pré-sal, com envolvimento do consulado norte-americano, através do Instituto Brasileiro do Petróleo, uma organização que representa os interesses das multinacionais no Brasil. Para o engenheiro, diversos fatores já noticiados, como o roubo de notebooks da Petrobras em 2008, a ativação da Quarta Frota dos Estados Unidos no mesmo ano, o impeachment de Dilma em 2016, a mudança da Lei da Partilha e a nova política de preços da estatal estão costurados pelo mesmo fio condutor.


No final desta matéria, disponibilizamos duas cronologias da farsa do impeachment que derrubou Dilma Rousseff da Presidência da República:


DESMONTE DO ESTADO A farsa do impeachment contra Dilma, assim como em vários países do subcontinente latino-americano, não é mera coincidência e demonstra que há um projeto muito bem planejado e está muito além das fronteiras do Brasil. Bolsonaro representa uma continuidade e um aprofundamento do golpe. No prólogo do livro Por que gritamos golpe?: para entender o impeachment e a crise, publicado em junho de 2016 pela editora Boitempo, a secretária de Relações do Trabalho da CUT, Graça Costa, discorre sobre o desmonte do Estado.

"Tempos sombrios estes em que vivemos, tempos em que o que há de pior na política depõe a presidente da República para impor a uma nação inteira quase cem anos de retrocesso. Somente um golpe é capaz de conduzir o país a tamanho atraso. Assistimos atônitos, à luz do dia, a movimentos rumo ao desmonte do Estado. Proposta de privatização do patrimônio público e desvinculação constitucional dos gastos sociais obrigatórios visam instituir um Estado mínimo no Brasil, com todos os prejuízos que isso traz para as políticas públicas de proteção social. Vivemos um golpe contra o povo trabalhador. Uma reforma da previdência elevando a idade mínima para a aposentadoria e desvinculando o piso previdenciário do salário mínimo. Uma reforma trabalhista que aprova a prevalência do negociado sobre o legislado, transformando, em questão de tempo, o fim dos direitos consagrados na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Uma grande tormenta se desenha no horizonte, uma tragédia para todos que sonham viver num país desenvolvido com justiça social".


Em apenas quatro anos, os retrocessos no Brasil são evidentes. O golpe que destituiu a ex-presidenta Dilma Rousseff trouxe inúmeros prejuízos ao país. Abaixo, reunimos algumas informações que indicam a queda da qualidade de vida da população e do desenvolvimento do país, em diversas áreas.


SOBRE O GOLPE E A ECONOMIA

Com Temer na Presidência, o Brasil teve um desempenho pífio na economia, fechando 2017 com um PIB de apenas 1%, puxado pelo bom momento das exportações e pelo crescimento do consumo das famílias reforçado pela liberação do FGTS, mas o volume total de investimentos voltou a registrar queda pelo quarto ano consecutivo (-1,8%), o que derrubou a taxa de investimento como proporção do PIB a 15,6%, a mais baixa da série histórica iniciada em 1996. A taxa média anual de desemprego no Brasil subiu de 11,5% para 12,7% entre 2016 e 2017. Já no governo Bolsonaro, antes mesmo da pandemia do coronavírus, o desemprego atingia 13,4 milhões de brasileiros e a economia vive um ciclo de estagnação. A renda do brasileiro diminuiu e o governo demonstra que suas políticas são insuficientes para a retomada de crescimento do Produto Interno Bruto.


CIÊNCIA E TECNOLOGIA A redução de recursos para a ciência e tecnologia, por parte do governo Bolsonaro, serve de exemplo para comparar o Brasil atual com o país do período anterior a 2016. Em 2013, o orçamento no setor foi de R$ 8,5 bilhões. Já em 2019, os valores orçamentários destinados ao setor, que eram de 4,4 bilhões, tiveram corte de 42%, totalizando R$ 2,6 bilhões. A PEC 95, que ficou conhecida como a Emenda da Morte, resultou em uma redução de R$ 19 bilhões, apenas em 2019. Como a lei determina o congelamento dos gastos com educação e saúde pelo período de 20 anos, a PEC 95 representa um dos maiores retrocessos para o desenvolvimento do país.


EDUCAÇÃO E SAÚDE

Desde o golpe que destituiu Dilma da Presidência da República, uma série de medidas que contribuem com a precarização do ensino público estão sendo tomadas. A PEC do Teto de Gastos aprovada por Michel Temer desenhou um cenário de precariedade e subfinanciamento para a saúde pública no Brasil. Além disso, em novembro de 2016, Michel Temer sancionou a Lei 13.365/2016, que revoga a obrigatoriedade da participação da Petrobras na exploração do petróleo da camada pré-sal. A medida impacta diretamente os recursos da estatal que têm que ser destinados para educação e saúde.


Atualmente, Jair Bolsonaro vem atacado a educação pública no Brasil, com diversos cortes que prejudicam todos os estudantes e trabalhadores da área. O atual ministro da Economia Paulo Guedes, quer aprovar um projeto de desvinculação orçamentária que acaba com os investimentos obrigatórios em saúde e educação. Ao congelar as despesas por 20 anos, Temer abriu caminho para o desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS), referência mundial saúde pública. No Balanço de 100 dias do governo de Bolsonaro fica evidenciado que, se não houvesse a vinculação do orçamento, o valor aplicado no SUS entre 2000 e 2017 não chegaria a 40% do que foi investido nesse período. Isso significa que o sistema seria equivalente a 1/3 do que é hoje.


O golpe foi determinante também para o fim do programa Mais Médicos, criado em 2013 pela presidenta Dilma Rousseff e que garantiu atendimento médico pela primeira vez para ao menos 700 municípios, que até então não dispunham de profissionais e nem de serviços. Durante cinco anos, 20 mil médicos cubanos atenderam mais de 110 milhões de pacientes. Os números não foram suficientes para impedir que Bolsonaro retirasse os cubanos do Mais Médicos. Do total de brasileiros que assumiram os postos deixados pelos médicos cubanos, 15% desistiram em seguida.


DIREITO DOS TRABALHADORES

O golpe de 2016 trouxe inúmeras consequências para o país. Com o apoio do então deputado federal Jair Bolsonaro, Temer aprovou a Reforma Trabalhista, em 2017, sob a justificativa de que era preciso modernizar as relações de trabalho e com a promessa de gerar 2 milhões de novos empregos. Entretanto, no final de 2018, dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostraram que o golpista não chegou nem perto. Foram criadas pouco mais que 290 mil vagas com carteira assinada. O aumento da informalidade, as altas taxas de desemprego e a “pejotização” do trabalho impactaram negativamente inclusive na arrecadação da Previdência Social. O estudo “Previdência x Providência”, dos pesquisadores José Roberto Afonso e Juliana Damasceno de Sousa, aponta uma forte evasão dos salários maiores do caldeirão de contribuições para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).


A reforma trabalhista foi uma das mudanças impostas pelas forças políticas conservadoras que sustentaram a farsa do impeachment. Direcionada a favorecer o empregador, a reforma retirou a isonomia entre a força de trabalho x empregador, o que acabou dificultando e amedrontando o empregado quando da busca do seu direito, em função do risco de ser condenado. Neste caso, sendo sucumbente, cabe ao empregado pagar as custas periciais e honorárias. Além de atacar o direito dos trabalhadores, as mudanças acabaram interferindo nas relações de emprego e desemprego. O Brasil do pós-golpe contabilizava 27,585 milhões de trabalhadores subutilizados (desempregados, subocupados, desalentados ou na inatividade por falta condições) e 12,575 milhões de trabalhadores desempregados.


DESIGUALDADE SOCIAL O relatório País estagnado: um retrato das desigualdades brasileiras – 2018, divulgado pela organização não governamental Oxfam Brasil, mostra que entre 2016 e 2017 a redução da desigualdade de renda no Brasil foi interrompida pela primeira vez nos últimos 15 anos - reflexo direto da recente recessão econômica. A estagnação fez com que o Brasil caísse da posição de 10º para 9º país mais desigual do planeta no ranking global de desigualdade de renda de 2017. Em 2019, a queda foi ainda maior, passando de 0,545 em 2018, recorde da série histórica da pesquisa iniciada em 2012, para 0,543 em 2019. Embora faça demagogia com o Bolsa Família, Bolsonaro se somou a Temer na investida de desmonte do programa de distribuição de renda. Em seu primeiro mês de gestão, o atual presidente cortou 381 mil benefícios e descartou reajustar os valores pagos para famílias de baixa renda. Temer foi autor de corte recorde na história do programa. Entre julho de 2014 e julho de 2017, houve uma redução de 1,5 milhões de bolsas pagas. O resultado foi que, em março de 2017, a ONU registrou que o Brasil caiu 19 posições no ranking de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).


Temer iniciou o desmonte do Minha Casa Minha Vida. Em 2017, foram investidos somente 9% dos valores previstos para o programa. A redução afetou os mais pobres, beneficiários da faixa 1 do programa. Bolsonaro segue o mesmo receituário. Em seus primeiros meses de governo, colocou o programa e 50 mil empregos em risco, ao atrasar repasses que somam R$ 450 milhões para as construtoras. Desde a criação do Minha Casa Minha Vida, milhões de moradias foram construídas para abrigar milhões de famílias que não tinham um lar. De 2009 a 2014, durante as gestões petistas, foram 6,8 milhões de beneficiários e 1,7 milhão de moradias entregues – mais 1,7 milhão que estavam em construção – em mais de 5.288 municípios.


NOVAMENTE A FOME

Logo nos primeiros dias de governo, Jair Bolsonaro acabou com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), por meio da Medida Provisória 870. O órgão era responsável por elaborar políticas de combate à fome. A extinção arbitrária torna-se ainda mais equivocada considerando que a fome está de volta no Brasil. Foi o que apontou o relatório “Panorama da Segurança Alimentar e Nutricional na América Latina e Caribe 2018”, divulgado em novembro do ano passado, por instituições ligadas ao sistema da Organização das Nações Unidas (ONU). Antes dos governos petistas, 18,8 milhões de brasileiros sofriam com a fome. Os 13 anos de governos Lula e Dilma não apenas garantiram acesso de milhões de brasileiros à comida, mas também à alimentação saudável. Em 2014, o Brasil foi retirado do “ Mapa da Fome”, elaborado pelo órgão da Agricultura e Alimentação (FAO) da ONU.

PANDEMIA E DESGOVERNO

A omissão do governo do presidente Jair Bolsonaro diante da propagação do coronavírus no país agravou ainda mais a crise econômica, atingindo principalmente a população mais pobre e vulnerável. A pandemia levou milhares de pequenas empresas a fecharam suas portas, aumentando o desemprego, realidade que já atinge milhões de trabalhadoras e trabalhadores em todo o país. O descaso de Bolsonaro diante da necessidade de adotar medidas preventivas, como o distanciamento social, contribuiu para que o Brasil permanecesse por quase três meses como epicentro da covid-19 no mundo. Sem estratégias eficientes por parte do governo Bolsonaro, que está há mais de cem dias sem ministro da Saúde, o país não consegue registrar redução do número de mortes e de contaminados, consequentemente a crise econômica se prolonga por mais tempo.


DESEMPREGO NA PANDEMIA

Com a pandemia, o país perdeu 8,9 milhões de postos de trabalho em apenas três meses e o número de ocupados no Brasil atinge menor nível da série histórica. Dados divulgados no dia 14 de agosto pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o número de desempregados no Brasil, diante da pandemia do coronavírus, teve alta de 31% em 12 semanas, o que corresponde a um aumento de cerca de 3,1 milhões de brasileiros sem trabalho no país no período. A população fora da força de trabalho atingiu a marca recorde de 77,8 milhões de pessoas, alta de 15,6% na comparação com o trimestre anterior. Com isso, a soma do número de desempregados e de pessoas fora da força de trabalho (90,5 milhões) superou mais uma vez o de ocupados no país (83,3 milhões). Ou seja, atualmente tem mais gente sem trabalhar do que trabalhando no país.


PRÉ-SAL

Antes do movimento golpista, o pré-sal era tido como importante patrimônio nacional. Seria a fonte de financiamentos para projetos de cunho social, especialmente nas áreas de saúde educação, e até blindagem para a conta de transações correntes (comércio e serviços), permitindo, assim, que o país pusesse em prática um plano estratégico de desenvolvimento. As transformações no setor começaram com a retirada da Petrobras da condição de operadora única, liquidando o regime de partilha, reduzindo a exigência do conteúdo local e ampliando incentivos tributários. Tudo isso formulado sob o argumento de que uma empresa estatal tem mais probabilidade de se contaminar com a corrupção. No mundo real, contudo, o processo-farsa que a Operação Lava Jato montou para supostamente desbaratar uma gigantesca teia de "caixa dois" acabou em meras perseguições políticas seletivas, sem nenhuma consequência ou comprovação concreta de que o objetivo era verdadeiramente esse.


DESMONTE DA PETROBRÁS

Nos últimos cinco leilões realizados, coube à Petrobras apenas 25% do total, ao passo que as petroleiras do Reino Unido (Shell e BP), dos Estados Unidos (ExxonMobil e Chevron) e da China (CNOOC, CNPC, CNODC e Repsol Sinopec) obtiveram, respectivamente, 26,2% (13,5 bilhões), 20% (10,3 bilhões) e 9,5% (4,9 bilhões) das reservas. Esses números representam o avanço do processo de desmonte da Petrobras, iniciado na “era FHC” e acelerado com o espectro da Operação Lava Jato, que pavimentou o caminho do golpe de 2016.


LEILÃO ESCANDALOSO Recentemente, a Petrobras anunciou a venda de três plataformas de produção de petróleo em um site de leilões públicos e praticamente entregou as unidades pela bagatela de 1,45 milhão de dólares. Apenas uma unidade nova de produção FPSO custa entre 500 a 800 milhões de dólares, segundo os cálculos feitos pelo consultor Adam Muspratt e que foram publicados no site Oil and Gas iQ. O valor mencionado por Muspratt não inclui custos de instalação. As três plataformas localizadas na bacia de Campos eram unidades semissubmersíveis e tinham capacidade para produzir 25 mil barris de petróleo/dia, em águas rasas e semirasas. As três unidades estão paradas, mas com todos os certificados em dia e aptas a produzir, com complexos sistemas de produção, refrigeração e filtragem de água, entre outros.


A venda das plataformas faz parte de uma estratégia da direção da companhia, privilegiando suas atividades de exploração e produção de petróleo (E&P) na província do pré-sal, colocando à venda – ou mesmo interrompendo a produção – as demais áreas onde a empresa atua. Esse processo de parada de produção exigirá o descomissionamento de vários campos e a venda como sucata de unidades de produção situadas nestas áreas


Dia 3 e junho de 2016, a ex-presidenta Dilma Rousseff esteve em Porto Alegre, na Esquina Democrática, e participou de ato político. Confira os vídeos.



Um número infinito de textos, artigos, reportagens e análises de todos os tipos foram escritas a partir do golpe que destituiu Dilma da Presidência.


BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS O professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Boaventura de Sousa Santos, ainda em 2016, já alertava sobre a nova onda mundial de tomada do poder sem uso de forças militares. "Estamos envolvidos em uma luta não só nacional, mas internacional, dada a importância do Brasil. É imperativo unir os esforços e ter alguma clarividência sobre o momento difícil que enfrentamos. Estou absolutamente convicto de que se trata de um golpe parlamentar e de que estamos diante de um governo ilegítimo. Um golpe diferente dos que ocorreram em Honduras e no Paraguai, mas que tem, no fundo, o mesmo objetivo, que é, sem qualquer alteração constitucional, sem qualquer ditadura militar, interromper o processo democrático".


NOAM CHOMSKY Em 2017, um ano após o golpe, o linguista e ensaísta norte-americano Noam Chomsky, professor do Massaschussets Institute of Technology (MIT), concedeu entrevista a uma rede de televisão e falou sobre a farsa do impeachment de Dilma Rousseff, referindo-se ao perfil dos algozes de Dilma no Congresso. "No dia 17 de abril do ano passado, dos 367 deputados que votaram a favor do prosseguimento do impeachment, 119 respondem por crimes na Justiça comum ou eleitoral ou estão envolvidos em suspeitas. Pela primeira vez, no entanto, aquela sessão de votação permitiu à maioria da população brasileira, que assistia pela televisão aberta, conhecer o nível dos seus parlamentares. Quase nenhum, ao justificar seu voto pelo impeachment, citou o suposto crime de responsabilidade cometido por Dilma. A maioria resolveu homenagear filhos, esposas, maridos, Deus e até figuras da ditadura militar", observou


MICHAEL LÖWY O sociólogo brasileiro Michael Löwy, diretor emérito de pesquisas do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), escreveu um artigo intitulado "Da tragédia à farsa: o golpe de 2016 no Brasil", em que faz eferência a processos semelhantes ao que estava em curso no Brasil. "Já tivemos golpes em Honduras e no Paraguai, e possivelmente teremos outro na Venezuela. Isso mostra que a democracia já não está mais sendo útil, que ela está atrapalhando a implantação das políticas neoliberais. Essa foi também a história recente da Grécia. O povo grego escolheu um caminho e o capital europeu, personificado na Comissão Europeia, passou por cima dos resultados eleitorais em prol das leis do mercado. Se antes já vivíamos em uma democracia de baixa intensidade, agora parece que até mesmo essa democracia era intensa demais para as classes dominantes e para o capital financeiro. Toma-se, portanto, o caminho das medidas de exceção, de maneira diferente em cada país", avaliava Löwy.


O sociólogo Michael Löwy fez uma análise sobre o atual presidente do Brasil diante da propagação do coronavirus. No artigo O neofascista Bolsonaro diante da pandemia, publicado no blog da Boitempo, Löwy afirma que "um dos fenômenos mais inquietantes dos últimos anos é a espetacular ascensão, no mundo inteiro, de governos de extrema direita, autoritários e reacionários, em alguns casos com traços neofascistas: Shinzo Abe (Japão), Modi (Índia), Trump (USA), Orban (Hungria) e Bolsonaro (Brasil) são os exemplos mais conhecidos.


Não é surpreendente que vários deles reagiram à pandemia do coronavírus de forma absurda, negando ou subestimando dramaticamente o perigo. Foi o caso de Donald Trump nas primeiras semanas, e de seu discípulo inglês, Boris Johnson, que chegou a propor que se deixasse o conjunto da população se infectar com o vírus, para assim “imunizar coletivamente” toda a nação – claro, com o custo de algumas centenas de milhares de mortes… Mas diante da crise, os dois tiveram de recuar, no caso de Boris Johnson, sendo ele mesmo gravemente atingido. O caso do Brasil torna-se assim especial, porque o personagem do Palácio da Alvorada persiste em sua atitude “negacionista”, caracterizando o coronavírus como uma “gripezinha”, definição que merece entrar nos anais, não da medicina, mas da loucura política. Mas esta loucura tem sua lógica, que é a do “neofascismo”.


O neofascismo não é a repetição do fascismo dos anos 1930: é um fenômeno novo, com características do século XXI. Por exemplo, não toma a forma de uma ditadura policial, respeita algumas formas democráticas: eleições, pluralismo partidário, liberdade de imprensa, existência de um Parlamento, etc. Naturalmente, trata, na medida do possível, de limitar ao máximo estas liberdades democráticas, com medidas autoritárias e repressivas. Tampouco se apoia em tropas de choque armadas, como o eram as SA alemãs ou o fascio italiano."

foto: divulgação PR

IMPRENSA GOLPISTA

O afastamento da presidenta Dilma Rousseff se deu por meio de um golpe que envolveu o Legislativo, o Judiciário e os meios de comunicação. Uma sucessão de fatos evidenciaram a participação do trio no desmonte da democracia. Apesar das inúmeras denúncias sobre a entrega do patrimônio público brasileiro às empresas estrangeiras, a grande imprensa sempre esteve alinhada aos setores mais conservadores do país, tendo cumprido papel determinante antes, durante e depois do golpe travestido de impeachment.

Em junho de 2013, manifestações que começaram com pautas ligadas ao transporte público e o direito à cidade ganharam fôlego e novas cores, com o surgimento de grupos organizados e financiados por movimentos como o MBL e o Vem Pra Rua. Dois anos depois, em março de 2015, mês decisivo para a definição dos rumos da crise política, diversas análises produzidas pelo Intervozes buscaram captar o posicionamento dos veículos vinculados às grandes corporações, bem como a relação com as instituições que deveriam zelar pela democracia. Os textos demonstram a existência de uma clara articulação entre mídia e Judiciário. Aos poucos, a política foi sendo judicializada, a partir de argumentos aparentemente imparciais. O resultado deste verdadeiro bombardeio de notícias fez com que parte expressiva dos brasileiros apoiassem o impeachment de Dilma, como uma solução para a crise política do país.


O golpe que derrubou Dilma foi sendo construído a partir da repetição massiva de notícias, somado ao modelo de exclusão do contraditório da cobertura jornalística dos principais veículos de comunicação e de uma carga incessante de argumentos e opiniões contrárias ao governo da então presidenta. A falta de pluralidade de opiniões, somada à própria estrutura que organiza os meios de comunicação no Brasil regidos por uma lógica estritamente comercial, foi estratégia imprescindível da direta para a efetivação da farsa do impeachment. Além disso, a posse dos canais de rádio e TV por grupos religiosos e/ou políticos, garante a proliferação dos discursos estabelecidos pelas elites políticas nacionais.


GLOBO E OS GOLPES À DEMOCRACIA

Não é de agora que a Rede Globo está alinhada à direita brasileira. Além do silêncio e da conivência com o golpe de 1964 e com o regime militar, a emissora da família Marinho usou o escândalo Proconsult para tentar inviabilizar a vitória de Leonel Brizola, em 1982, ao governo do Rio de Janeiro. Outro fato muito lembrado no Brasil foi a manipulação da apresentação do maior comício das Diretas Já, em São Paulo, em 1984, tratando a manifestação como uma festa em comemoração ao aniversário da capital paulista. Mas, talvez a mais gritante interferência da emissora nos rumos políticos do Brasil tenha sido a edição que fez após o debate televisivo entre Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Melo, candidatos à Presidência da República em 1989. A emissora beneficiou a candidatura de Collor, de forma parcial e às vésperas da eleição, tendo atuação determinante para a vitória do mesmo.



A linha do tempo do pré-sal



A linha do tempo política.



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