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Suor e cerveja ruim, por Paulo Gaiger (*)

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“Não vá ao supermercado nos domingos” é meu primeiro livro de contos e crônicas, lançado em 2019 na 65ª Feira do Livro de POA pela editora Traços&Capturas. Curiosamente, nenhum dos contos e crônicas tem este título. Mauro Póvoas, professor e doutor em literatura da FURG, que fez a apresentação do livro, foi quem cunhou o título a partir da crônica “Um gigante solto na avenida”, em que reflito sobre a vida insana que temos e que nos leva, entre outras coisas nem tão boas, a fazer compras aos domingos, quando o melhor seria estarmos nos parques, no cinema, no teatro, lendo um livro, meditando, namorando, reunidos com as pessoas queridas. Para a maioria dos brasileiros, as recomendações de uma vida saudável, de bem estar, de horas de bom sono, não fazem o menor sentido porque são metas inacessíveis. Para quem tem que cumprir 44 horas semanais, ou mais, para segurar o tranco, são só uma miragem as horas de ginástica, de cuidados com a saúde e alimentação, de acompanhamentos de filhas e filhos na escola, de leitura, de arte e cultura, de tempo livre. Coagidos pelo discurso da eficiência e da alta produção em menor tempo, milhões de brasileiras e brasileiros acabam retidos em um ambiente cinza e circular de estresse, alienação, deserotização, onde o simulacro de escape são os programas medíocres de televisão, o consumo por si, uma torcida organizada, as redes sociais, o templo, a violência. Difícil ver boniteza na vida. O pão nosso de cada dia justifica qualquer atrocidade que façamos contra nós mesmos e contra os outros. Nenhum programa eleitoral ou de governo desenha a redução das horas laborais semanais. Seria ótimo que isso viesse a acontecer. De 44 para 36, por exemplo. Então o discurso de vida com saúde, arte e beleza tomaria sentido e estaria ao alcance de muita gente. Supreendentemente, leio nos jornais que Lula festeja o fato de que no ano de 2024, boa parte dos feriados cairá em fins de semana e que, portanto, o PIB deverá aumentar. PIB e vida com saúde e beleza em um país miserável como o Brasil sempre implicam que da vida terá que ser subtraído o que ela tem de melhor e de potência. Que se danem os trabalhadores. Trabalhem e trabalhem 44 horas, suor e cerveja ruim. Sem feriados e sem boniteza.


(*) Paulo Gaiger é artista, cronista, Prof. da UFPel

Autor de A METÁFORA DAS FLORES (Ed.Viseu)


 
 
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