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Foto do escritorAlexandre Costa

Os fascinantes cofres do apocalipse, por Paulo Gaiger*

Algumas famílias das ilhas, dos bairros Mathias Velho, Sarandi, Cidade Baixa resistem em deixar suas casas ou apartamentos. As águas já encobrem as moradias das primeiras, mesmo assim, fincam o pé na água. Amor aos bichinhos e, sobretudo, temor aos saques que certamente acontecerão, não importa se a casinha é de gente muito pobre. Facções e bandos de ladrões só tornam pior o que já é um tormento, porque facções e bandos de ladrões são pessoas covardes e ruins. Outros covardes e ruins não saqueiam casas, mas roubam a capacidade de discernir e de empatia ao produzir e propagar fake news, as chamadas milícias digitais. Estão ombro a ombro com as facções, no mesmo lado, agindo criminosamente, causando mal, todavia muito mais extenso e difícil de desmantelar. É mais factível colocar uma facção na cadeia do que uma quadrilha produtora de fake news atrás das grades. Não poucas pessoas, no entanto, sem água em seus telhados, têm fake news inundando seus juízos e, desde aí, como parvos, emitem sentenças orgulhando-se da narrativa feita de mentiras como arautos da verdade sem fundamento. Nunca reconhecem ou pedem desculpas pela sacanagem! Facções tampouco. Se os produtores de fake news contam com milhares de parvos para disseminar sua criação demoníaca, os ladrões e as facções contam com os comerciantes inescrupulosos que compram o butim e o revendem a patifes de plantão. Se a razão da vida é ganhar dinheiro, e quanto mais, melhor, em uma tragédia como a que vivemos que mal há em inventar pix para falsas ações de ajuda humanitária? Até adolescentes fazem isso. Falsas ONGs, falsos pix, falsos socorros e resgates e tristezas e mortes reais, tudo vale para ganhar o vil metal e exibir-se: trabalhei pela minha família. Gente abjeta. Tudo dentro do livre mercado, afinal. O que será isso? A roda gira intencionalmente no sentido determinado por uma elite, deixando feridos, mortos, pobres e muito sofrimento. Alegria efêmera para poucos, entintando as cores do capitalismo das livres iniciativas para alguns, você quer, você pode! Teu desejo é um direito! O vil metal que nos torna iguais aos nossos podres, muda princípios, valores, projetos, rumos e decisões. O escritor espanhol Mariano José de Larra, lá nos anos de 1836, escreveu, fulo da vida e sarcasticamente “Nada como muitos cofres para eleger: um cofre dificilmente se equivoca; dois cofres sempre acertam, e muitos cofres juntos fazem maravilhas”. Serei irônico e sarcástico como Larra: as “maravilhas” que estamos vivendo no Rio Grande do Sul se devem aos muitos cofres. Sempre com a ajuda providencial das flexibilizações e alterações das legislações de proteção ambientais aos níveis estadual e federal. Deputados estaduais e federais, senadores do país votaram por um Estado e Brasil desflorestados, por reservas indígenas destruídas, por rios contaminados. O governador aprovou. São políticos, corporações, mineradoras, agronegócios e grandes investidores unidos em projetos predatórios dissimulados sob o manto da narrativa de desenvolvimento, progresso, geração de empregos e cofres cheios. Todos covardes e ruins, só que bem falantes e arrumadinhos. Um ribeirinho me indagou: “meu avô se banhava neste rio, eu já não posso mais. Isso é que é o desenvolvimento?”. Facções, bandos de ladrões, produtores de fake news, parvos, comerciantes inescrupulosos, patifes de plantão, gente abjeta, políticos, corporações e investidores predatórios, formam um bando peçonhento, que impõe sua verdade, maquia e fotografa, destrói e culpa os outros. Mas ora muito. Reza para que Deus nos proteja da enchente. Risos nos céus. Ou ora e pede perdão pelos pecados. Pede perdão para Deus, nunca para quem machucou, ofendeu e fez o dano. Ou para a filha ou para a sobrinha que assediou ou estuprou em casa ou no abrigo. Desde sempre, a maior parte da violência contra meninas e adolescentes acontece dentro das casas das famílias cristãs, é bíblico. O abrigo, depois de algumas noites de adaptação, passa a ser a extensão da violência do lar. Homens de nada, cagões. Estes também oram pela família e integram o bando peçonhento. A geografia humana predatória, mutilada de humanidade, viciada em tirar proveito de tudo e de todos, gananciosa e sem escrúpulos. De entregadores de botijão ao dono da Tesla Motors e do X, dando golpes, com arminha na mão, vociferando que lugar de bandido é na cadeia. E o fascismo é fascinante, deixa a gente ignorante e fascinada, canta o Humberto Gessinger. E não aprendemos quase nada, nada, nada...


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