CAPĆTULO 3 - O MAPA DA DESIGUALDADE RACIAL: UM PAĆS PARTIDO PELA COR
- Alexandre Costa
- 19 de nov.
- 4 min de leitura

por Alexandre Costa | jornalista
O Brasil Ć© a maior nação negra fora da Ćfrica. Ainda assim, Ć© tambĆ©m o paĆs onde ser negro significa viver menos, ganhar menos, estudar menos, sofrer mais violĆŖncia e ter menos acesso Ć justiƧa. As estatĆsticas nĆ£o deixam margem para interpretaƧƵes inocentes: a desigualdade brasileira tem nome, tem cor e tem endereƧo.
O que os dados mostram Ć© devastador, mas necessĆ”rio. Este capĆtulo revela o mapa da desigualdade racial no paĆs ā e mostra por que o Rio Grande do Sul, apesar de ser o estado mais branco do Brasil, Ć© um dos territórios onde essa desigualdade se manifesta com mais forƧa.
BRASIL: A MAIOR POPULAĆĆO NEGRA FORA DA ĆFRICA
Segundo o Censo 2022, 55,5% dos brasileiros sĆ£o negrosĀ (pretos + pardos).Em nĆŗmeros absolutos, sĆ£o mais de 112 milhƵes de pessoasĀ ā maior que toda a população de muitos paĆses. Mas esse protagonismo demogrĆ”fico Ć© acompanhado por uma exclusĆ£o sistemĆ”tica:
⢠negros morrem mais
⢠negros são presos mais
⢠negros estudam menos
⢠negros ganham menos
⢠negros têm menos acesso à saúde
⢠negros vivem em territórios mais precÔrios
O Brasil vive sob o mito de que é uma democracia racial. Os números, porém, contam outra história.
RENDA: BRANCOS GANHAM 64% MAIS
A PNAD ContĆnua mostra que:
⢠um trabalhador branco ganha, em média, até 64% mais que um trabalhador negro
⢠mulheres negras tĆŖm a menor renda do paĆs
⢠negros são maioria em trabalhos informais, precÔrios e de baixa remuneração
O salÔrio é um espelho direto da herança escravocrata. O mercado de trabalho ainda organiza funções a partir da lógica colonial: quem comanda é branco; quem serve é negro.
EDUCAĆĆO: O ACESSO CHEGA, MAS A DESIGUALDADE RESISTE
Ensino Superior (Brasil)
⢠25,8% dos brancos têm diploma universitÔrio
⢠apenas 12,3% dos pardos e 11,7% dos pretos chegam lÔ
O avanço das cotas a partir de 2012 mudou o cenÔrio: pela primeira vez, negros passaram a ocupar metade das vagas nas universidades públicas.
Ensino Superior (RS ā Ufrgs)
⢠antes das cotas: menos de 8% de estudantes negros
⢠depois das cotas: aproximadamente 27%
A diferenƧa Ć© gigantesca ā e mostra a importĆ¢ncia das polĆticas pĆŗblicas de reparação.
VIOLĆNCIA: O ESTADO MATA MAIS QUEM Ć NEGRO
O Atlas da ViolĆŖncia revela:
⢠76,5% das vĆtimas de homicĆdio no Brasil sĆ£o negras
⢠jovens negros têm quase 3 vezes mais chances de serem assassinados
⢠a letalidade policial atinge majoritariamente homens negros
No Brasil, a cor da pele define o risco de morte.
PRISĆES: O NEGRO Ć O ALVO PREFERENCIAL DO CARCERE
Segundo SENAPPEN:
⢠quase 70% da população carcerÔria do Brasil é negra
A criminalização do negro Ć© um processo contĆnuo que comeƧou com a abolição sem reparação. A escravidĆ£o terminou, mas a vigilĆ¢ncia permanente continuou.
SAĆDE: A VIDA NEGRA VALE MENOS
⢠mulheres negras morrem até duas vezes mais por causas relacionadas à gravidez
⢠negros têm menos acesso a exames preventivos
⢠a mortalidade precoce é maior entre jovens negros
O racismo também é um problema de saúde pública.
TERRITĆRIO: O CEP Ć UM DESTINO IMPOSTO
O Brasil Ć© geograficamente segregado. E Porto Alegre Ć© um dos exemplos mais explĆcitos dessa divisĆ£o:
Bairros brancos
⢠Moinhos de Vento⢠Bela Vista⢠Petrópolis⢠MontāSerrat⢠TrĆŖs Figueiras
Bairros negros
⢠Restinga
⢠Bom Jesus
⢠Mario Quintana
Rubem Berta
⢠Lomba do Pinheiro
O mapa racial de Porto Alegre Ć© o mapa de sua desigualdade. O mesmo padrĆ£o se repete no paĆs inteiro: centros e zonas nobres brancos; periferias e favelas negras.
RIO GRANDE DO SUL: O ESTADO MAIS BRANCO E, AO MESMO TEMPO, UM DOS MAIS DESIGUAIS
Dados essenciais
⢠população negra: 21,4%
⢠brancos: 78,4%
⢠população prisional negra: entre 65% e 70%
⢠risco de morte de jovens negros: 3 a 4 vezes maior
⢠renda negra: 40% menor
⢠presença negra na universidade: cresce apenas com cotas
A geografia da exclusĆ£o gaĆŗcha nĆ£o Ć© acidental. Ć o resultado de trĆŖs sĆ©culos de escravização e de mais de um sĆ©culo de polĆticas de embranquecimento, apagamento cultural e segregação urbana.
O Sul nĆ£o estĆ” fora da história brasileira da desigualdade. O Sul é a história ā apenas mais silenciada.
POR QUE OS NĆMEROS IMPORTAM
Os dados nĆ£o estĆ£o aqui para explicar o óbvio. EstĆ£o para desmontar o mito que sustentou o paĆs por dĆ©cadas: a ideia de que somos um povo miscigenado, cordial, sem conflitos raciais profundos.
As planilhas mostram que:
⢠não existe desigualdade sem raça
⢠não existe violência urbana sem raça
⢠não existe pobreza sem raça
⢠não existe exclusão educacional sem raça
E, ao mesmo tempo:
⢠cada polĆtica pĆŗblica que avanƧa reduz desigualdade racial
⢠cotas funcionam
⢠programas sociais funcionam
⢠presenƧa negra em universidades transforma o paĆs
⢠narrativas negras reescrevem a história
Os nĆŗmeros mostram o tamanho da ferida ā mas tambĆ©m mostram onde comeƧa a cura.
ENTRE O PASSADO E O FUTURO
Quando olhamos para o mapa da desigualdade racial no Brasil, percebemos que nĆ£o Ć© apenas um mapa social. Ć um mapa histórico. A escravidĆ£o durou mais de 320 anos. A abolição sem reparação completa 137. O paĆs viveu muito mais tempo produzindo racismo do que combatendo suas consequĆŖncias.
E Ć© por isso que, para enfrentar o presente, Ć© preciso antes entender o passado e reconhecer quem sempre sustentou este paĆs: o povo negro.
No próximo capĆtulo, vamos ao coração da resistĆŖncia, das expressƵes culturais e da espiritualidade ā os lugares onde o Brasil negro criou cura, sentido e sobrevivĆŖncia.
Alexandre CostaĀ Ć© responsĆ”vel peloĀ www.esquinademocratica.com.brĀ
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