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Foto do escritorAlexandre Costa

MANUAL PARA CANDIDATOS - VOLUME 4, POR PAULO GAIGER (*)


Chegamos ao último volume dos 10 volumes prometidos do Manual para candidatos. Promessa feita, promessa cumprida. A Startup Be a Winner espera que os candidatos e candidatas sigam o exemplo desta grande empresa especializada em orientações, estímulo e ética de ocasião para quem quer chegar como vencedor e vencedora ao topo, topando todas. O futuro é logo ali. Já não mais precisarão afagar crianças, brincar com pets, sujar as mãos cumprimentando mãos de gente pobretona, visitar bairros pobres, postos de saúde e escolas destroçadas, congelar os zigomáticos, falar mal dos parceiros ocultos da milicia armada, contratar gente pobretona para sacudir bandeiras. A partir de logo mais, muito dinheiro no bolso e saúde, educação, saneamento, petróleo e amazônia para vender. Sabemos que devem estar exaustos, depois de semanas disputando a simpatia das esquinas, ruas, bairros e cidades. Não é mole sustentar mentiras e ser falso por tanto tempo fingindo ser democrata e a favor da paz. Mas verão que valeu o esforço, o crime compensa e sempre termina em pizza quando se trata de gente graúda. Agora podem voltar aos empreendimentos visando a intensificação da violência. Sim, queridas e queridos: a tão propalada paz não serve para quem quer triunfar, não dá dinheiro, não é lucrativa, não abre vagas de emprego, não amedronta as pessoas, não as torna apavoradas e submissas, não vende armas. A paz, senhoras e senhores, é o fim dos negócios ilícitos que dão uma dinheirama. Quem irá lucrar com abraços e beijos de amizade, encontros da vizinhança, trabalhos comunitários, com a solidariedade e mutirões, festas até o amanhecer, com a diminuição das desigualdades econômicas e sociais, com o respeito, com as artes? Os bancos é que não. A indústria bélica, muito menos. Os fabricantes de cercas elétricas e alarmes, tampouco. As milícias e os traficantes entrariam em desespero. Os templos perderiam fiéis e fechariam as portas. Ninguém de vocês poderá fazer apologia da violência, obviamente. Assim como na campanha não disseram que eram a favor da privatização da água e da saúde ou que eram a favor da venda e destruição das reservas florestais, porque pegaria muito mal, agora falem da paz, pela paz, como um exercício de retórica, um sermão das montanhas, um profeta. Nesse caso, sugerimos que voltem a abraçar crianças, a publicar fotos da família com o crucifixo ao fundo. A filhinha empunhando uma 12. Vale tudo com o dinheiro público. Ergam suas mãos para o céu e agradeçam porque sempre terá alguém perto de vocês, bem pago, é verdade, para colocar em sigilo de 100 anos as suas safadezas. E ninguém se importará. Numa situação de paz, vocês estariam ralados. Mas com a violência disseminada, quem se preocupará? A paz que irão defender, meu caros e caras, será a mesma de sempre: os ricos cada vez mais ricos; os pobres na miséria crescente, mas quietinhos em seu lugar, na santa paz. Aí virão os movimentos sociais, os grupelhos de mulheres, os variados coletivos sabe-se lá de quem, a turminha da ecologia, alguns partidinhos da oposição, as professorinhas do Paulo Freire, pra encher saco, dizer que tudo está errado, que outro mundo é possível. A Startup Be a Winner em seu quarto volume, o último dos dez prometidos, ensina: chamem todos e todas de comunistas, digam que o mundo está assim por culpa desta gentalha insatisfeita e sem fé, de que esses fedelhos esquerdopatas querem roubar sua maloca, seu arroz com feijão, sua bicicleta. Para os da classe média, vociferem que a gentalha sem fé quer colocar a gente pobre e preta na mesma escola e universidade dos rebentos tão bem nutridos e cheirosos, que querem que os trabalhadores e trabalhadoras tenham direitos, que irão distribuir mamadeiras de piroca. Deus nos acuda, né? A violência tem esse aspecto positivo: ela apaga temas essenciais. Distrai o povinho todo apavorado. Aproveitem os quatro ou seis anos de mandato e sejam canalhas a top. Garantirá a reeleição. Be a winner.


(*) Paulo Gaiger é Artista professor do Centro de Artes – UFPel.

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