AS RUAS FORAM OUVIDAS PELO SENADO, QUE REJEITOU E ARQUIVOU A PEC DA BLINDAGEM, POR CARLOS WAGNER*
- Alexandre Costa
- 26 de set.
- 4 min de leitura

Nas primeiras horas da tarde de quarta-feira (24), por unanimidade, os 26 senadores da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) derrubaram a PEC da Blindagem, que exigia autorização do Congresso para ação penal contra os parlamentares. Por ter sido reprovada por unanimidade, o destino seria o arquivamento. Mas irá à votação no plenário, por ter sido feito um acordo entre os presidentes da CCJ, Otto Alencar (PSD-BA), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). Levar a PEC ao plenário do Senado é um ritual para dar uma satisfação às milhares de pessoas que no domingo (20) ocuparam as ruas de várias cidades brasileiras se manifestando contra a PEC da Blindagem. E também contra a PEC da Anistia, que tem o objetivo de aprovar uma anistia geral e irrestrita para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, e seus seguidores que tentaram dar um golpe de estado. A PEC da Anistia está tramitando na Câmara. Na tarde de quarta-feira, o presidente do Senado encaminhou para o arquivamento a PEC da Blindagem. A derrota da PEC fechou uma porta importante para o avanço do crime organizado nas instituições brasileiras. Vamos falar sobre o assunto.
Antes de seguir em frente, julgo necessário acrescentar uma explicação a nossa conversa. A blindagem aos parlamentares não foi inventada agora. Ela fazia parte da Constituição de 1988, cujo Artigo 53 previa imunidade aos congressistas com o objetivo de mantê-los a salvo da máquina repressiva deixada funcionando na administração federal pelos militares que havia dado o golpe de estado em 1964 e se mantiveram no poder até 1985. Em 2001, os congressistas chegaram à conclusão que a máquina repressiva não existia mais e que as imunidades parlamentares estavam servindo para outros propósitos. Resolveram então reformar o Artigo 53, derrubando a exigência da permissão do Congresso para processar parlamentares. Em linhas gerais, foi isso. Vamos seguir a nossa conversa. Trabalho com jornalismo investigativo há um bom tempo. E a primeira lição que se aprende é que as organizações criminosas funcionam como se fossem uma empresa que busca bons negócios. Cito um exemplo. Na última quinta-feira de agosto (28), a Polícia Federal, a Receita Federal e o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) de São Paulo deflagraram a Operação Carbono Oculto, com o objetivo de desmontar atividades do Primeiro Comando da Capital (PCC). A organização criminosa usava fintechs, bancos digitais, que até então não precisavam informar ao Banco Central o nome do dono das contas, para lavar dinheiro nas empresas que operam o bilionário mercado de combustíveis adulterados e que funcionam usando camuflagens legais. Na ocasião, os jornais estamparam nas manchetes: “PCC chegou à Farias Lima”, referência à Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, onde funciona o maior centro financeiro do Brasil e da América do Sul.
Na avaliação de vários senadores e deputados federais, a PEC da Blindagem tornaria as campanhas eleitorais um bom negócio para o PCC e outras organizações criminosas, que poderiam investir na eleição do seu pessoal para o Congresso. Lembro aqui o seguinte. Os banqueiros do jogo do bicho montaram as primeiras organizações criminosas no Brasil, especialmente no Rio de Janeiro. Nos anos 90, fiz uma série de reportagens sobre os bicheiros que consumiu quase um ano investigação. Na época, era significativa a infiltração dos bicheiros na política, nas polícias e em outros órgãos administrativos. Nas fronteiras do Brasil com Paraguai, Bolívia, Colômbia e Peru é significativa a influência econômica na vida diária das comunidades das pequenas organizações criminosas ligadas ao tráfico de drogas, à exploração dos garimpos e à venda ilegal de madeiras nobres da Floresta Amazônica. Lembro o seguinte. A presença do PCC e de outras organizações criminosas nos garimpos cresceram durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, que desmontou o aparato de fiscalização ambiental, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), com o objetivo de facilitar a vida dos garimpeiros na região. O PCC viu no desmonte da fiscalização uma oportunidade de investir nos garimpos de ouro e bauxita. Pensem bem. Caso persistisse a PEC da Blindagem, o próximo passo das organizações criminosas na região seria investir nas eleições de 2026. Vou citar um fato cujos detalhes podem ser encontrados em jornais, livros e estudos científicos. Organizações criminosas existem em todos os cantos do mundo, incluindo os Estados Unidos e os países europeus. Nos dias atuais, a lavagem de dinheiro é um problema mundial. E qualquer governo que deixar uma porta aberta na sua segurança permitirá que o crime organizado se infiltre na máquina administrativa.
Para arrematar a nossa conversa. Circulam muitas teses sobre os motivos que levaram os parlamentares a propor a PEC da Blindagem. Não vou entrar nesta discussão por entender que é tarefa para os colegas que fazem a cobertura diária. E não é uma tarefa fácil, tal é a quantidade de teorias. Prefiro lembrar que a nossa função como repórteres é ficarmos atentos aos acontecimentos e transformar as novidades em reportagens. Uma tarefa que já foi mais fácil. Mas que nos dias atuais tem se tornando problemática devido o escasso número de repórteres nas redações e o imenso volume de trabalho. Mas, mesmo assim, os repórteres vêm conseguindo dar o seu recado. Por último, fica a pergunta. Que influência terá no andamento da PEC da Anistia o destino PEC da Blindagem? Difícil prever. Mas as manifestações de rua já deram o recado do que a população pensa do assunto.

PUBLICADO ORIGINALMENTE EM: https://carloswagner.jor.br/blog/as-ruas-foram-ouvidas-pelo-senado-que-rejeitou-e-arquivou-a-pec-da-blindagem/
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