AOS 78 ANOS, JOSÉ ALBERTO SILVA LANÇA SEU PRIMEIRO LIVRO E ROMPE O SILÊNCIO SOBRE A HISTÓRIA NEGRA DE PORTO ALEGRE COM “ALMANAQUE DE FLORES, BEIJOS E MENTIRAS”
- Alexandre Costa
- há 13 minutos
- 3 min de leitura
Aos 78 anos, o ativista e escritor José Alberto Silva estreia na literatura com uma obra que é muito mais do que um livro. Almanaque de Flores, Beijos e Mentiras, lançado em maio de 2025, é um testemunho vivo de resistência, memória e afeto da população negra de Porto Alegre e da Região Metropolitana. A publicação reúne poesias, crônicas, cartas e reflexões que resgatam a história de territórios invisibilizados pela narrativa oficial, como a Ilhota, o Areal da Baronesa e a Colônia Africana.
Já nas primeiras páginas, José Alberto Silva oferece o poema Je Sais e mostra que para encantar os leitores não precisam muitas palavras. Abaixo, o pequeno poema em francês e na sequência a tradução. JE SAIS
Je sais qu’il n’est pas possible
changer les choses
Je sais qu’il n’est pas possible
changer les personnes
Mais il est possible,
oh si,
changer les yeux de monde. EU SEI
Eu sei que não é possível
mudar as coisas
Eu sei que não é possível
mudar as pessoas
Mas é possível, oh sim,
mudar os olhos do mundo.
Financiado com recursos da Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar nº 195/2022), por meio do Ministério da Cultura e da Secretaria de Estado da Cultura do RS, o livro foi realizado pela Frente Negra Gaúcha, com coordenação editorial de Silvia Maria Abreu, curadoria de Camila Botelho e projeto gráfico de Maria Helena dos Santos. O lançamento ocorreu no Plenarinho da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em um evento marcado pela emoção e pela valorização da memória coletiva. “Almanaque de Flores, Beijos e Mentiras” traz memórias afetivas, poesias e crônicas dos territórios negros da capital gaúcha
Nas palavras do autor, “lançar este livro é um ato de amor e de resistência negra, um compartilhamento de vivências, dores e ideias baseado em vozes não valorizadas ou ouvidas”. Com uma escrita que mescla lirismo, crítica social e ancestralidade, a obra se propõe a romper o silêncio e a construir pontes entre passado, presente e futuro.
José Alberto cresceu em uma casa localizada na esquina das ruas Lopo Gonçalves e José Alfredo (antiga rua da Margem), ponto de encontro da comunidade negra em Porto Alegre. A residência, animada pela irmã Neura Regina, pianista e figura central nas lutas culturais da cidade, foi palco de festas, debates políticos e organização de movimentos negros. Foi nesse ambiente, ainda criança, que ele começou a registrar suas primeiras memórias, escrevendo bilhetes e poemas nas madrugadas, quando a casa cheia de irmãos lhe oferecia poucos momentos de silêncio.
“Desde os sete, oito anos, escrevia como uma forma de organizar as ideias. Era meu jeito de existir”, relembra.
A estrutura do livro rompe com os formatos tradicionais. Misturando gêneros como poesia, crônica, memória e homenagem, Almanaque de Flores, Beijos e Mentiras é também ferramenta de educação antirracista, já adotada em rodas de leitura e oficinas em municípios como Porto Alegre, Viamão, Canoas e Novo Hamburgo. O conteúdo da obra é acessível e sensível, incluindo recursos como audiodescrição, interpretação em Libras e versões em vídeo para plataformas digitais.
José Alberto Silva é membro fundador da Frente Negra Gaúcha, da Sociedade Florestal Aurora e do Observatório de Desenvolvimento da Comunidade Negra. Com trajetória marcada por sua atuação nos movimentos sociais, sua escrita é enraizada na tradição oral africana, nos terreiros, nas ruas e nas casas cheias de vozes silenciadas.
“Não há alternativas fora da ideia de brotar, que podemos simar espírito ou história e identidade. Simar ideias é brotar amoros”, escreve ele em uma das passagens do livro, criando neologismos afetivos e políticos que rompem com a linguagem tradicional e desafiam o leitor a sentir, refletir e resistir.
A distribuição do livro é gratuita (limitada a 1 exemplar por CPF) e pode ser solicitada por e-mail (frentenegragaucha.diretoria@gmail.com) ou pelo WhatsApp (51 98350-5533). A obra está disponível também em formato digital.
Mais do que um livro, Almanaque de Flores, Beijos e Mentiras é um chamado à memória coletiva. Um registro poético, político e necessário sobre tudo o que tentaram apagar — mas que continua florescendo. De certa forma, tal qual o poema francês, José Alberto Silva nos faz acreditar que é possível mudar os olhos do mundo. 📲 CURTA, COMPARTILHE, COLABORE E CONTRIBUA
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