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Foto do escritorAlexandre Costa

Vazamento de informações à imprensa pode prejudicar investigações do caso Marielle Franco e Anderson Gomes


O vazamento de informações à imprensa pode prejudicar as investigações dos assassinatos da ex-vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do seu motorista Anderson Gomes, que em março completará seis anos. A revelação de que o ex-policial Ronnie Lessa firmou um acordo de delação premiada, divulgada no domingo (21/1) pelo colunista de O Globo, Lauro Jardim, provocou uma crise na investigação do caso.


A publicação de informações pode fazer com que Lessa recue da decisão de colaborar com a Justiça, pode fazer com que os investigadores deixem o caso, por temer eventuais retaliações a suas famílias. Em 2021, as promotoras do caso Marielle também abandonaram a investigação, alegando não terem sido incluídas na negociação da delação premiada de Júlia Melo Lotufo, viúva do Capitão Adriano, matador de aluguel assassinado na Bahia e vinculado a diversos ramos do crime organizado no Rio de Janeiro.


De acordo com o colunista de O Globo, a delação premiada de Ronnie Lessa, ainda aguardava homologação da Justiça. O procedimento padrão adotado pela equipe de investigação da Polícia Federal orienta, neste estágio, mesmo que extraoficialmente, a não noticiar a adesão do depoente. O Intercept Brasil publicou nova matéria em que cita uma série de erros na investigação, a partir de pistas falsas, 'fogo amigo' e trocas de delegados. "Até a Polícia Federal chegar no nome de Domingos Brazão, houve uma série de erros e pistas falsas que atrasaram em quase seis anos a resposta para esta pergunta: Quem mandou matar Marielle?", adverte a reportagem publicada no site na tarde de quarta (24/1) e assinada por Flávio VM Costa e André Uzêda.


A reportagem traz informações sobre os caminhos e as instâncias da investigação. Raquel Dodge, ex-Procuradora Geral da República, sempre insistiu na federalização do caso Marielle Franco. Um dia após o assassinato da vereadora e do motorista Anderson Gomes, quando ela ainda presidia o Conselho Nacional do Ministério Público, emitiu uma nota determinando a instauração de “procedimento instrutório de eventual incidente de deslocamento de competência”. E solicitou a entrada da Polícia Federal nas investigações. O texto menciona que o caso gerou uma rápida e intensa cobertura internacional, com notícias publicadas nos principais veículos de comunicação do mundo e debate na ONU.


O Intercept cita os problemas na condução dos trabalhos para apurar a autoria do atentado, que gerou a "investigação da investigação" do Caso Marielle, também cita o troca-troca de delegados, a disputa travada entre a federalização e a manutenção nas instâncias estudais, entre outros. Por fim, a reportagem indica a existência de dúvidas sobre qual seria a real motivação de Domingos Brazão para encomendar a morte de Marielle. Uma das hipóteses é que ele teria agido por vingança contra Marcelo Freixo, seu ex-colega na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que o denunciou na CPI das Milícias, em 2008, e também na Operação Cadeia Velha, que prendeu figuras do MDB, ex-partido de Brazão.


Outra hipótese é uma disputa de terra na zona oeste do Rio de Janeiro, área de domínio de Domingos Brazão. Havia uma disputa de terra nessa área para regularização de um condomínio e a vereadora trabalhava para que a região fosse classificada como de interesse social.


Leia a matéria do Intercept Brasil. Veja abaixo 10 pontos elencados pelo G1, citados quando o duplo homicídio completou cinco anos, em março de 2023 e não esclarecidos nas investigações:


1.Quem mandou matar Marielle e qual a motivação do crime?

As novas equipes do MP e da PF estão revisando todas as linhas de investigação.

Já foram citadas, por exemplo, suspeitas contra o bicheiro Rogério Andrade. Segundo os promotores do Gaeco, o que aproxima o contraventor da morte da vereadora do PSOL foi a empreitada dele com Lessa no mês seguinte ao assassinato de Marielle. Em abril de 2018, Rogério e Lessa começaram as tratativas para a abertura de um bingo clandestino na Barra da Tijuca. A defesa de Rogério Andrade informou que ele não tem qualquer envolvimento com a morte da vereadora Marielle Franco. Políticos também sempre estiveram no radar dos investigadores. Dois deles foram citados: o do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado Domingos Brazão e do ex-vereador Cristiano Girão. Em 2019, a Procuradoria-Geral da República apresentou denúncia contra Brazão por obstrução das investigações do Caso Marielle. Quase um ano depois, o Superior Tribunal de Justiça mandou o processo para o Tribunal de Justiça do Rio, onde está sob sigilo. O advogado de Brazão, Ubiratan Guedes, disse que a defesa não vai se manifestar. Cristiano Girão é o outro investigado. Ele é ex-vereador e ex-chefe da milícia da Gardênia Azul. Está preso, acusado de ser o mandante de um duplo homicídio, que também teria a participação de Lessa. Os investigadores não falam se a atuação política de Marielle Franco pode ter confrontado interesses. O advogado Zoser Hardmann disse que "Cristiano Girão não tem nenhuma relação com esses fatos e todas as autoridades do estado sabem disso". Apesar de os três já terem nomes terem aparecido nas investigações, as dúvidas sobre quem mandou matar Marielle seguem sem resposta.


2. Por que Lessa e Elcio jamais pesquisaram o nome Marielle Franco na internet?

Ao contrário do que muitos imaginam, Ronnie Lessa e Elcio Queiroz jamais pesquisaram sobre Marielle Franco no Google. A análise dessas pesquisas foi um dos elementos principais da acusação, principalmente contra Lessa. O PM reformado fez pesquisas sobre o deputado Marcelo Freixo, aliado de Marielle, sobre mulheres negras, mas jamais digitou as palavras Marielle Franco no Google. Ao menos, não que se tenha prova.


3. Como Lessa tinha informações de todos os passos dela?

Mesmo sem ter pesquisado pelo nome de Marielle, os investigadores acreditam que Lessa tinha informações detalhadas da rotina da vereadora, como o local e horário de curso de inglês dela e um encontro com o ex-marido, na casa dele, no Rio Comprido. Três pesquisas feitas por Lessa indicam que ele seguia os passos dela são:


  • Praça São Salvador, no Flamengo, que fica próxima ao curso de inglês que Marielle fazia;

  • Campus UFRJ, onde ela fez uma palestra naquele período;

  • o principal deles, a Rua do Bispo, 227. O endereço foi pesquisado às 19h39 do dia 12 de março de 2018. Marielle esteve nesse endereço na manhã deste mesmo dia, na casa do ex-marido. O encontro só estava registado na agenda do celular da vereadora.


4. Quantos homens havia no carro e como eles saíram do condomínio?

Na tarde do crime, Élcio deu entrada com seu carro particular no Condomínio Vivendas da Barra, e o porteiro anotou, erradamente, que ele iria para a casa 58 (registrando, inclusive, que a autorização havia sido dada pelo então deputado federal Jair Bolsonaro, o que foi desmentido depois). Elcio chegou exatamente às 17h07, segundo o registro do computador que grava as ligações feitas pelo interfone. Não há, no livro do condomínio, a hora exata da saída e em qual carro, depois que Lessa foi pego na casa 66. Houve ainda uma divergência de perícia sobre quantas pessoas estavam no veículo usado no crime. A análise de vídeo feita pelo setor responsável pela DH indicava que haveria um homem no banco do carona, na frente do carro, quando ele passava na esquina da Rua dos Inválidos. Para a perícia do MP, Lessa estava no banco traseiro, e Élcio dirigia o carro.


5. Em que ponto da rua os acusados trocaram de carro e por que câmeras não foram verificadas?

De acordo com a denúncia que levou os réus a júri, o Cobalt prata clonado usado pelos assassinos passou pelo Quebra-Mar, no fim da Avenida Lucio Costa, na Barra da Tijuca, às 17h24. Se o Cobalt não estava cadastrado no condomínio e eles não saíram com o carro de Élcio, não é possível saber como eles deixaram o condomínio. Além disso, a polícia, à época, não apreendeu câmeras de prédios e estabelecimentos comerciais da Lucio Costa. Os investigadores tinham em mãos uma imagem do veículo entrando na rua do Quebra-Mar. Pela imagem, percebe-se que o carro está vindo da Avenida Lucio Costa (ou Avenida do Pepê). A rua deve ser uma das que têm mais câmeras na cidade, mas não há um único registro do veículo passando pela via, desde que os dois acusados teriam saído do Condomínio Vivendas da Barra, a cerca de 4 quilômetros de distância.

Por isso, não é possível saber em qual ponto da avenida e como eles trocaram de veículo, entrando no carro clonado que havia sido preparado para ser usado no crime.


6. Qual foi a rota de fuga utilizada pelos assassinos?

Caso Marielle: câmeras flagram carro dos criminosos em dois momentos no dia do crime

A última imagem que existe do Cobalt prata usado pelos assassinos na noite do crime foi captada por uma câmera de vigilância do Centro de Convenções Sul-América.

O local fica a 200 metros do ponto onde Marielle e Anderson foram executados.

A partir daí, não se sabe para onde o carro utilizado pelos criminosos seguiu.

Carro usado no ataque a Marielle — Foto: Reprodução/TV Globo


7. Onde está a arma do crime?

Polícia e MP acreditam que, após sua prisão, Lessa mandou comparsas e parentes jogarem algumas de suas armas fora, entre elas a submetralhadora alemã utilizada no crime. Fuzis teriam sido jogados ao mar da Barra da Tijuca no dia seguinte à prisão do acusado. O descarte teria acontecido pouco antes de a especializada e o Ministério Público encontrarem o local onde Ronnie Lessa montava as armas, depois de receber as peças que eram compradas pela internet. Um barqueiro disse, em depoimento ao MP, que um homem jogou armas longas, inclusive um fuzil, de dentro do seu barco em 2019.


Bruno Gordo (E) e Djaca, presos na Operação Submersus — Foto: Reprodução/Redes sociais

O homem, segundo o MP, é Josinaldo Lucas Freitas, o Djaca, cúmplice de Ronnie Lessa. Ele foi preso pela Polícia Civil do Rio. Dezenas de buscas foram feitas, até com ajuda da Marinha, mas nenhuma arma foi encontrada e as autoridades não conseguem afirmar que a arma do crime estaria entre as que foram lançadas no mar. Os comparsas de Lessa foram presos e condenados por obstrução de justiça, juntamente com o próprio Lessa. Posteriormente, foram soltos.


8. Cadê o Cobalt e quem clonou o veículo?

De acordo com as investigações da Polícia Civil, o veículo Cobalt prata original, que pertencia a uma mulher em Nova Iguaçu, estava clonado desde 2016. Há indícios de pelo menos dois clones circulando pelo Rio na noite do crime. Nunca ficou claro, durante as investigações, quem fez o trabalho de clonagem, feito em 2015. Um suspeito da região da Curicica chegou a ser preso, mas não confessou. Outro clonador suspeito, conhecido como Toddynho, da região de Santa Cruz, morreu e seu corpo não apareceu. O Cobalt clonado utilizado por Lessa e Elcio já tinha realizado atividades de monitoramento anteriormente em locais próximos aos lugares por onde Marielle passou em quatro dias de fevereiro. Imagens mostram o carro passando pela Tijuca pouco depois das 18h do dia 18 de março. No entanto, um segundo clone passou pela Avenida Brasil, na altura do km 50,7, em Santa Cruz, no sentido Centro, às 18h10. A General Motors disse que o Cobalt era de modelo entre 2012 e 2015: 3.937 Cobalt prata destes modelos foram emplacados no país no período, 443 deles no Rio de Janeiro. Dezenas de veículos foram verificados pela polícia, mas os investigadores nunca encontraram o carro utilizado no crime.


9. O braço do assassino era mesmo de que cor?

Em depoimento, um morador de rua disse ter visto um braço de um negro, forte, no banco de trás do carro, fazendo os disparos contra o veículo de Marielle. Na busca e apreensão feita na casa de Lessa, os investigadores apreenderam um manguito – espécie de meia que cobre parte do braço – preto. Para eles, Lessa, que é branco, usou o item para esconder suas tatuagens e mudar a cor de seu braço para confundir eventuais testemunhas. No processo, no entanto, a defesa contesta a versão do manguito. E anexou uma nota fiscal da loja Decathlon, que mostra que o item só foi adquirido por Lessa dois meses após o crime.


10. Quem vendeu a munição usada no crime?

A investigação jamais concluiu como o lote de munição UZZ-18, de lote vendido para a Polícia Federal, foi parar nas mãos dos assassinos de Marielle e Anderson.

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