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Prisão dos suspeitos de planejar morte de Marielle Franco pode levar a mais envolvidos e a outros crimes

Foto do escritor: Alexandre CostaAlexandre Costa

As prisões do deputado estadual fluminense Chiquinho Brazão, do União Brasil, do seu irmão Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio, e de Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil daquele estado, como suspeitos de terem planejado os assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, além de não encerrarem o caso, colocam em xeque a credibilidade de órgãos e instituições de segurança pública e de instâncias da própria Justiça carioca.


O avanço das investigações, a partir do excelente trabalho da Polícia Federal, demonstram as tramas perversas e as engenhosas articulações utilizadas pelo crime organizado com a participação de políticos, autoridades em elevados cargos públicos, igrejas e milícias. A participação de Rivaldo Barbosa não chega a ser surpreendente, mas revela o enraizamento das organizações criminosas em diversas e difusas áreas do estado.

O delegado Rivaldo Barbosa, preso pela Polícia Federal (PF) neste domingo (24) pela suspeita de acobertar os responsáveis pelo assassinato da vereadora Marielle Franco, foi indicado para a chefia da Polícia Civil do Rio de Janeiro pelos generais Walter Braga Netto e Richard Nunes. Barbosa assumiu o cargo uma semana antes do crime. Até então, ele chefiava a Delegacia de Homicídios. O delegado entrou no radar da PF em 2019, por conta de um relatório do delegado federal Leandro Almada, em que apontava que Barbosa deveria ser investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) pela suspeita de que teria recebido R$ 400 mil em propinas para atrapalhar as investigações.


"Foram trazidas suspeitas de suposta corrupção envolvendo servidores da Delegacia de Homicídios, especificamente sobre o então chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, e servidores a ele relacionados, notadamente chefes da equipe de investigação da Delegacia de Homicídios", diz um trecho do relatório, conforme publicou o colunista de O Globo, na edição de domingo (24/3). Não se trata de jargão ou metáfora, mas as prisões dos idealizadores do crime brutal que tirou as vidas de Marielle Franco e de Anderson Gomes são apenas a ponta do iceberg. Os inúmeros erros cometidos durante as investigações, a partir de pistas falsas, atrasaram em quase seis anos a resposta para a indagação sobre quem mandou matar Marielle.


FEDERALIZAÇÃO DAS INVESTIGAÇÕES Um dia após o crime, a ex-Procuradora Geral da República Raquel Dodge, que na época também presidia o Conselho Nacional do Ministério Público, emitiu uma nota determinando a instauração de “procedimento instrutório de eventual incidente de deslocamento de competência”. A magistrada insistia na federalização do caso, repassando à Polícia Federal as investigações sobre o crime que teve repercussão internacional, com notícias publicadas nos principais veículos de comunicação do país e do mundo.


ERROS PRIMÁRIOS E GROSSEIROS As falhas da Polícia Civil do Rio de Janeiro para chegar aos mandantes dos assassinatos de Marielle e do seu motorista acabaram gerando a "investigação da investigação". Com a prisão de Rivaldo Barbosa talvez seja possível compreender a sucessão de erros, considerados primários e grosseiros, durante a apuração de informações, recolhimento de provas e nas inúmeras buscas por pistas falsas, além da troca-troca de delegados e das pressões para manter o caso nas instâncias estudais.

O "CARA" DA CASA DE VIDRO E A MORTE DE MILICIANO Reportagem publicada pelo site The Intercept Brasil, no final de abril de 2021, revelaram detalhes de escutas telefônicas da investigação sobre Adriano da Nóbrega, morto no dia 9 de fevereiro de 2020, em uma ação da polícia da Bahia. O ex-capitão do Bope era comandante do “Escritório do Crime”, um braço de extermínio ligado à milícia de Rio das Pedras. O relatório das escutas indica claramente a ligação dos milicianos com uma pessoa identificada como “Jair”, “cara da Casa de Vidro” e “PRESIDENTE”.


As ligações foram transcritas em um relatório da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Polícia Civil do Rio de Janeiro, elaborado a partir das quebras de sigilo telefônico e telemático de suspeitos de ajudar Adriano da Nóbrega durante os 383 dias em que circulou foragido pelo país.


A "Casa de Vidro" seria uma referência ao Palácio do Planalto. Após o Ministério Público do Rio concluir que o “cara da casa de vidro” seria Jair Bolsonaro, as escutas teriam sido interrompidas. A interrupção das escutas reforça a ideia de que o "Jair" seria o presidente da República, já que o MP estadual não tinha competência para investigá-lo. Restava ao Ministério Público do RJ apenas informar à Procuradoria-Geral da República, que é o órgão competente para dar continuidade às investigações sobre o “chefe do escritório do crime”, miliciano ligado a Flávio Bolsonaro, morto em conflito com a polícia da BA.


O Intercept revelou que a primeira ligação supostamente feita ao presidente aparece no dia 9 de fevereiro de 2020 à noite, logo após a morte de Adriano da Nóbrega. Ronaldo Cesar, o Grande, identificado pela investigação como um dos elos entre os negócios legais e ilegais do miliciano, disse a uma mulher que ligaria para o “cara da casa de vidro”. No telefonema, Grande “demonstra preocupação com pendências financeiras" e comenta ter alertado "Adriano que ‘iria acontecer algo ruim'". Ele mostra preocupação, dizendo querer saber "como vai ser o mês que vem" e que a “parte do cara tem que ir”.

 

Depois de quatro dias, em 13 de fevereiro, Grande fala com um homem supostamente não identificado (HNI), o qual a transcrição classifica entre parêntesis como “PRESIDENTE” em letras maiúsculas.


OMISSÃO DE MORO NAS INVESTIGAÇÕES A advogada Izadora Gama Brito, executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Sergipe, concedeu entrevista ao Brasil de Fato, no dia 25 de abril de 2020, em que fez referência à omissão de Sérgio Moro, que deixou o Ministério da Justiça, apontando abertamente supostas ações irregulares de Jair Bolsonaro. "Abandonar o barco no momento em que Bolsonaro está absolutamente desgastado politicamente, sem aliados, é uma estratégia política. Isso não quer dizer que Moro não foi conivente e até omisso. O Moro não fez absolutamente nada para investigar o assassinato do Adriano Nóbrega, acusado de envolvimento com a milícia", argumentou a advogada.


DESDOBRAMENTOS A prisão dos suspeitos dos assassinatos de Marielle e de Anderson pode encerrar o caso definitivamente. Porém, as buscas por provas que comprovem a participação dos irmãos Brazão e do ex-chefe da Polícia Civil do RJ, por meio de celulares, computadores e documentos, devem revelar muitos os outros fatos e até mesmo a participação de outros idealizadores do brutal assassinato da vereadora do PSOL Marielle Franco e do seu motorista Anderson Gomes.

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