OMISSÃO E IMPORTUNAÇÃO DOS CONSELHOS DE MEDICINA
- Alexandre Costa
- 20 de mar. de 2021
- 4 min de leitura
Paulo de Tarso Riccordi (*)

Num país com 7% da população mundial, mas com 20% das mortes por Covid-19, as omissas direções do Conselho Federal e dos Regionais de Medicina não deram nenhuma palavra sobre o mandatário máximo do país afrontar a palavra científica de organizações mundiais e nacionais de Saúde, Institutos, pesquisadores, epidemiologistas e desmerecer vacinas contra o Covid-19, sabotar todas as orientações médicas, inclusive do próprio Ministério, quanto ao uso de máscaras e a não aglomerações.
As omissas direções do CFR e dos CRM até agora não deram nenhuma palavra sobre a insistência de Jair Bolsonaro e as recomendações do Ministério da Saúde para prescrição médica de hidroxicloroquina, azitromicina, ivermectina e nitazoxanida como tratamento precoce contra o coronavírus “em pacientes adultos, que apresentem sintomas leves, moderados ou graves da doença”, apesar da condenação da OMS e centenas de médicos e pesquisadores.
Até esta data, um ano após a eclosão da pandemia, quase 12 milhões de infectados e quase 300 mil mortos, e mesmo diante da falta da orientação do Ministério da Saúde, as omissas direções do CFM e CRM não deram nenhuma orientação unificadora de um protocolo de atendimento médico para tratamento a pacientes de Covid. Cada paciente receberá de diferentes e rotativos médicos prescrições medicamentosas diferentes. Qual a decisão da Enfermagem nesses casos?
Sem medidas efetivas para reduzir drasticamente a circulação de pessoas e a ampla transmissão e mutação do vírus, aumenta irrefreavelmente a contaminação, hospitalização e mortes por Covid no país, numa proporção impossível de ser acompanhada pela infraestrutura física hospitalar e quantidade de profissionais da Saúde habilitados. As Santas Casas e hospitais filantrópicos do Rio Grande do Sul nesta semana informaram as autoridades do estado que já lhes faltam medicamentos, oxigênio, e equipamentos de proteção individual para os profissionais de Saúde.
Neste, 18 de março, há no Rio Grande do Sul 771 mil casos identificados de pessoas infectadas, 3.500 hospitalizadas, sendo que para 292 delas não há leitos em UTI. Estão em macas, cadeiras, acomodações improvisadas e precárias, necessitadas de respiradores e atendimento profissional. Em todo o país, diariamente morrem dezenas de pessoas “na fila” de espera por falta dessas condições. Há dois dias, foram 70 em São Paulo. Há quinze, acabou a disponibilidade de leitos UTI Covid no estado. Mas o número de pacientes continua aumentando – pouco menos de 30% nos últimos quinze dias.
Muitos médicos e enfermeiros têm trabalhado em mais de um hospital, em casos referidos de plantões contínuos de 30 horas de trabalho. Vários profissionais de Saúde adotaram para si próprios o uso de fraldas geriátricas, por não poderem interromper os atendimentos, justamente pela falta de profissionais para tamanha demanda. A isso acrescenta-se o afastamento de milhares de profissionais em todo o país, por serem dos grupos de risco para a Covid e, ainda, as baixas diárias de médicos, enfermeiros, técnicos, pessoal de limpeza hospitalar, eles próprios contaminados pelo coronavírus em seu trabalho. Até hoje, estiveram afastados da linha de frente 28.660 profissionais da saúde – 590 nestes últimos sete dias – no estado.
SOLUÇÃO EMERGENCIAL
Diante da terrível crise da falta de profissionais de Saúde para trabalhar nas UTIs Covid, estados e prefeituras têm feito chamados tão desesperados quanto infrutíferos para contratação emergencial de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. Os estados do Acre, Amapá e Amazonas e várias prefeituras no país - pelo menos duas no RGS: São José do Norte e São Leopoldo – lançaram Editais que não foram respondidos.
Desde que se percebeu a aceleração das internações, o Congresso tratou de legislar, abrindo a possibilidade, diante da comprovada falta de médicos, para a contratação emergencial - e temporária - de médicos formados em Universidades no exterior, que ainda não tiveram seus diplomas validados por Universidades brasileiras. Os projetos de lei 2052 e 2104 da Câmara Federal e o 3654 do Senado tratam disso.
Confrontados com a angustiante alternativa de fechar as UTIs dos hospitais de suas cidades, vários prefeitos recorreram à Justiça e obtiveram autorização para abrir seus Editais, como São José do Norte.
Quem quer impedir a contratação de médicos para atender – emergencialmente – pacientes de Covid onde não há profissionais disponíveis? Acertaste! O Conselho Federal de Medicina e o Conselho Regional de Medicina. Os omissos para as prescrições médicas de Jair Bolsonaro, para as trapalhadas do rei da Logística no Ministério da Saúde, para a falta de protocolo médico nacional para Covid.
O CFM e os CRM são autarquias federais pagas – e bem pagas – não para zelar pelos interesses sindicais de suas profissões, mas sim pela qualidade dos serviços prestados aos cidadãos. Isso eles distorcem a seus interesses corporativos, como se fossem o sindicato médico. Por essa distorção mau caráter, os Conselhos Médicos tentaram impedir a viabilização do programa Mais Médicos, no governo Dilma Rousseff, que levou médicos brasileiros formados no exterior e médicos estrangeiros para os fundões do Brasil, onde os prefeitos não conseguiam que nenhum nacional se apresentasse para trabalhar.
Agora, todos os médicos disponíveis estão ocupadíssimos na frente da Covid. No disputadíssimo Hospital Moinhos de Vento, há falta de 280 profissionais. Em São Leopoldo, há 12 vagas para médicos e nenhum candidato. Faltam 25 técnicos de enfermagem. O pessoal em atividade está cumprindo jornadas de até 30 horas de trabalho na linha de frente. Como em tantos municípios do país, não sobrou nenhum para o hospital de São José do Norte, onde faltam 12 profissionais para os hospitais, UPAs e unidades básicas de saúde. Demandado pela Prefeitura, o juiz da 2ª Vara Federal de Rio Grande autorizou a contratação emergencial, provisória e temporal de médicos formados no exterior, ainda sem validação no Brasil de seus diplomas. Eles prestarão somente os atendimentos de baixa complexidade, na rede básica de saúde (as UBS), não nos hospitais. Desse modo, os médicos da Prefeitura serão dedicados aos atendimentos aos pacientes de Covid nas UTIs hospitalares.
Mas o Conselho Regional de Medicina, bem, os Conselhos de Medicina são a mais pura expressão do elitismo corporativista. Entre cidadãos morrendo por falta de atendimento médico e a contratação de médicos formados no exterior (ai, que ódio! E se vierem de novo os cubanos?), esses canalhas optarão por deixar as vagas abertas. Omissos e inoportunos.
Paulo de Tarso Riccordi é jornalista e professor universitário