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Foto do escritorAlexandre Costa

Milei avança contra a América do Sul e o Atlântico Sul como zona de paz, por Jorge Branco*

Durante o governo José Sarney, em 1986, o Brasil foi protagonista na construção de um acordo entre 24 países sul-americanos e africanos banhados pelo Oceano Atlântico ao sul da linha do Equador, a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul – Zopacas. No contexto internacional da época, marcado fortemente pela Guerra Fria e pela Guerra das Malvinas (que desacreditou o tratado de cooperação militar com os EUA quando este apoiou o Reino Unido contra a Argentina), o acordo imaginou poder se constituir como um contraponto à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Substituiu um projeto similar ao Sul do Oceano Atlântico: a Organização do Tratado do Atlântico Sul (OTAS).


Contudo, após um período de obscuridade nos anos 1990, fruto da política internacional do governo Fernando Henrique, retomou suas iniciativas no início da década de 2000, com a renovação dos acordos de cooperação e sua maior institucionalização, os fundamentos do acordo foram redefinidos. O objetivo da articulação entre os países periféricos e descolonizados, obviamente passou efetivamente a ser a garantia da soberania sobre a região e seu mar, a proteção dos recursos estratégicos e a ampliação do comércio e cooperação econômica sul–sul e a preservação ambiental. Para tanto, trata explicitamente, de excluir, em seus protocolos, a presença permanente das potências militares globais na região e as armas nucleares. Após novo período de congelamento durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, a partir da Reunião Ministerial de Mindelo (Cabo Verde) o acordo retomou importância.


Em uma forte demonstração de que a política internacional do direitista Javier Milei, presidente da Argentina, será de ataques constantes à integração entre os países do Sul global e da América do Sul, a Comandante Militar do Comando Sul do Estados Unidos – sub do sub do sub – foi recebida na Província de Terra do Fogo, na Patagônia Argentina, para assinar um acordo com o governo argentino. Este acordo, tem como centro a construção de uma “base naval conjunta” na região, e implica no rompimento de outros tantos acordos de infraestrutura com o governo chinês e na concessão de um meio logístico para os EUA ingressarem e permanecerem militarmente no Atlântico Sul e na Antártida.


Serão suspensos os projetos de construção de um complexo nuclear de fornecimento de energia em Buenos Aires, de represas hidrelétricas, de hidrovia e acordos para acesso ao lítio e terras raras. Durante a celebração do acordo, Javier Milei expressou nitidamente sua compreensão estratégica e seu objetivo: “Por eso hoy el mejor recurso para defender nuestra soberanía y para abordar de forma exitosa estos problemas es precisamente reforzar nuestra alianza estratégica con los Estados Unidos y con todos los países del mundo que defienden la causa de la libertad”.


Esse acordo é um grande golpe para as políticas desenvolvidas em parte das últimas décadas por países africanos e sul-americanos. Impõe uma potência militar e nuclear extrarregional no centro geográfico do circuito Atlântico/Antártida, dando maior capacidade à potência em impor militarmente sua política de controle sobre a região.


Assim como Bolsonaro, Milei cumprirá um papel deletério nas relações regionais e sul-sul. Sendo apoio para políticas de desaceleração e freamento da política de descolonização e soberania. Obviamente que Milei encontra apoio para tal política. Primeiro no maior beneficiário dessa política, os EUA, suas empresas e seus militares. Segundo, em setores do empresariado argentino e continental que veem neste tipo de política dependente uma possibilidade rápida de lucros, sem a necessidade de inversões de investimento em infraestrutura, tecnologia, conhecimento, emprego. O lucro fácil da economia dependente, onde as empresas viram exportadoras de comodities e importadoras de quinquilharias, levará alguns setores do empresariado ao apoio engajado nesta política destrutiva de Milei, como ocorreu no Brasil com Bolsonaro.


Mas, o mais grave é que a efetivação de acordos como este tem efeitos longevos e determinam fortemente as condicionantes de qualquer política de desenvolvimento soberano na região. A presença militar permanente de uma potência extrarregional no Atlântico Sul e na entrada da Atlântida não poderá ser desfeito com a simples troca de governo. Será uma Guantánamo em zona de paz, onde há petróleo, minerais raros, pesca e salários baixos.




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