top of page

JESUS’ WHITE MEN CORPORATION FOR PROFITS - NEGÃO ARMADO NO AEROPORTO É PRESO E MORTO PELA POLÍCIA

Foto do escritor: Alexandre CostaAlexandre Costa

Por Paulo Gaiger (*)

Não se comenta outra coisa nas redes. No Twitter, então, a comunidade patriótica tem disparado, mais do que o criminoso no aeroporto, balas mortais de sentenças e acusações: o negão ia assaltar, ia sequestrar o avião, negão bom é negão enterrado, depois essa negrada vem com essa palhaçada de racismo. Os estilhaços do disparo do negão criminoso atingiram uma funcionária de uma companhia aérea. Graças a Deus, ela está bem. Um pouco assustada, isso é verdade. A polícia agiu com eficácia, sem pestanejar e sem perguntar. Mal se ouviu o disparo, o negão já estava tombado ao solo, com o joelho de um policial em seu pescoço: eu não consigo respirar, teria dito. Aperta mais com o joelho, gritavam ao redor. Desculpa, eu só ia retirar a munição e a arma disparou... disse o bandido afrodescendente antes de morrer sem o oxigênio tão necessário às pessoas de bem. Aplausos na internet, desde o Planalto, condecorações aos policiais. Houve manifestações na frente dos cinemas contra a projeção do filme Medida Provisória. O povo de bem gritava: escravidão nunca existiu, chega de mimimi. Viva o mito! A família do negão criminoso não quis falar com os melhores programas da Tv, aqueles que ficam repetindo e repetindo as mesmas imagens da violência. Uma pouca vergonha essa família com o pé no inferno. Talvez seja fake, dizem por aí. Fala-se, no entanto, que a 360°, em aparente outro hemisfério da terra redonda, ou no mesmo lugar, para os terra-planistas, um ex-ministro da educação, homem branco, rico e pastor presbiteriano de um paiseco sob o comando de fascistas, ao abrir sua pasta de documentos no balcão de embarque para desmuniciar o revólver que levava nela, sem querer, fez a arma disparar, fazendo a bala perfurar o coldre, a pasta e seus estilhaços se esparramarem pelo piso do aeroporto da capital, ferindo uma funcionária de uma companhia aérea. Graças a Deus, ela está bem. Um pouco assustada, isso é verdade. Apenas um caso acidental, um descuido sem mais. O ex-ministro, homem branco, rico e pastor presbiteriano foi conduzido pela polícia com a educação que todo o suspeito merece, ainda mais sendo um ex-ministro, homem branco, rico e pastor presbiteriano, para prestar depoimento. Dizem que o ex-ministro é ex porque fez do ministério da educação uma negociata com pastores das igrejas irmãs. Não fez coisa alguma pela educação, mas fez pelos pastores. Ouro e dinheirão! Mas quem, entre as pessoas patriotas de bem, se importa? A bocca chiusa, nos becos protegidos pela noite, o povinho desconfiado comenta: se o homem branco e rico é pastor presbiteriano, acredita no Deus Todo-poderoso, por que carregar uma arma na pasta de viagem? Ele próprio não acredita no poder de Deus que prega em seu culto? Que Ele estará ao seu lado para protegê-lo? Um familiar deve ter dito: vai com Deus? Não, vou armado que é mais eficiente. Homem branco de pouca fé. Ou sacripanta, cochicham nas esquinas. Cogita-se que ele atualizou os dez mandamentos e o novo testamento. Tempos de capitalismo avançado, dirá. Esse papo de não roubar e não matar já era. Não cabe mais para aqueles, de boa fé e patriotas, que querem erguer Templos gigantes e reunir milhões de fiéis tolos. Não serve mais para o progresso, é preciso acabar com os índios, esses pagãos pelados pela floresta. Fogo neles! E rirá. Jesus, seguirá dizendo, não expulsaria os vendilhões do templo, mas se associaria a eles, ora bolas. Jesus não seria burro de perder uma oportunidade dessas. Ademais, pescadores como apóstolos? Bem capaz! Militares e empresários, isso é que é uma sacada. Na Santa Ceia vejo a mesa repleta de carnes nobres, Jesus entre empreendedores, corporações e forças armadas com seus membros eréteis, passando de mão em mão, viagras, lubrificantes íntimos, próteses penianas. Ao invés de pão caindo do céu, disparos de metralhadora sobre índios e pretos. Quanto ao negão criminoso lá de cima, não servia para nada, nem para procriar! Já foi tarde! Viva Jesus! Viva o mito! E rirá novamente fazendo o sancti amen! Talvez seja fake, dizem por aí!


(*) Paulo Gaiger é Artista professor do Centro de Artes – UFPel

bottom of page