Lançado em outubro de 2020, o Grifo é uma publicação de humor que reúne colaboradores de todo país, além da Argentina, Cuba, Itália, Irã.. Inspirado no Pasquim e na sua história de resistência à ditadura militar, estes profissionais altamente reconhecidos no mundo das artes gráficas, das charges, ilustrações e do jornalismo utilizam a sátira para contestar governos e políticos com tendências fascistas, obscurantistas e autoritárias. O nome é uma referência ao ser mitológico presente em diversas culturas antigas do oriente e que está associado à justiça, à luz e ao ciclo de morte e renascimento (leia mais no fim de matéria). Foi neste cenário, em plena pandemia de coronavírus, que estes idealistas ligados à GRAFAR (uma associação informal de humoristas gaúchos) retomaram um projeto antigo, iniciado no Brasil dos anos 70.
Para comemorar o seu primeiro aniversário, o Grifo lançou uma edição impressa na tarde de sábado, dia 6 de novembro de 2021, no Amelie - Baden Café Especiais, na Avenida Jerônimo de Ornelas, 431, no bairro Santana, em Porto Alegre. O Esquina Democrática acompanhou a atividade. Confira as fotos e o vídeo no final da página.
Diante dos olhos atentos de um grupo seleto de leitores e apoiadores deste jornal com cara de revista ou de revista com cara de jornal, Celso Augusto Schröder, ex-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e um dos idealizadores do projeto, lembrou de como surgiu a ideia. "Lá em 2019, quando nós fizemos a exposição Independência em Risco e que acabou sendo censurada e, em outro momento, naquele mesmo ano, no Clube de Cultura, nós fizemos uma alusão, durante um evento que contou com a a minha participação, do Eugênio e do Edgar Vasques, ao ambiente muito semelhante ao vivenciado em 1969 (ano que surge o Pasquim). Percebemos, então, a necessidade de retomar a publicação e, portanto, tínhamos que produzir um jornal", explica Schröder, afirmando que o Grifo se tornou uma expressão coletiva de pessoas que estão neste projeto, contribuindo espontaneamente com essa publicação de humor crítico. "O Grifo está consagrado, se tornou uma espécie de marca, impresso ou digital, que já é reconhecido e que teve origem com o Pasquim. E o fundador foi o ilustre Paulo de Castro, gaúcho de Passo Fundo, junto com o cartunista Jaguar e o também jornalista Sérgio Cabral. E esta publicação sempre nos guiou", argumenta o ex-presidente da FENAJ.
O editor da publicação, o jornalista Marco Antônio Schuster, ressalta o caráter político e contestador do Grifo. "Nestes dias tenebrosos, sentimos necessidade de usar todas as linguagens contra o fascismo, o negacionismo sanitário e a ignorância. A cada edição um dos desenhistas participantes é solicitado a fazer a sua versão dessa figura mitológica que foi escolhida como símbolo da publicação, que é o Grifo", explica.
Cabelos brancos são uma marca dos cartunistas da velha guarda, pelo menos para aqueles que ainda têm cabelos. Eugênio Neves é outro profissional experiente neste mundo dos traços e do humor. Enquanto esperava pelos convidados para o lançamento da edição impressa do Grifo, sentado na mesa do Biden Café, o Corvo, como é mais conhecido no meio, rabiscava em um papel, enquanto ressalta os aspectos ideológicos da publicação. "Nós temos posições políticas e elas são muito claras. Nem o maior pessimista das décadas passadas poderia aventar a hipótese de que Jair Bolsonaro seria eleito e é por isso que estamos aqui e nos juntamos a outras vozes. Denunciamos, entre outras coisas, a política genocida de Bolsonaro na gestão da pandemia e o objetivo nefasto do seu governo", avalia.
CENSURA É UM TIRO NO PÉ
Os vereadores de Porto Alegre alinhados ao presidente Jair Bolsonaro não imaginavam que ao censurar os 36 painéis com cartoons, charges e tirinhas dos cartunistas da Independência em Risco, estavam instigando a criação do Grifo, a partir do olhar crítico de profissionais do traço, entre eles cartunistas premiados internacionalmente como Edgar Vasques, Santiago, Leandro Bier, Latuff, Vecente, Schroder, Dóro, Elias, Alexandre Beck, Alisson Affonso, Bruno Ortiz, Edu, Eugênio Neves, Gui Moojen, Hals, Kayser, Koostela, Nik, e Uberti.
"Éramos meninos em torno de 20 anos, seguidores de Sampaulo, Sampaio, Canini, Carlos Nobre, Luís Fernando Veríssimo, Tarso de Castro e do pai de todos, Apparício Torelly, o barão de Itararé. Vários foram contratados pelos jornais locais. Os dois maiores diários abriram páginas aos sábados para amadores e a coisa brotou feito cogumelo". Apareceram dezenas de humoristas “prontos”. Fizemos exposições em praças e em galerias, publicamos muitos livros coletivos e individuais (o primeiro livro da poderosa editora L&PM foi o Rango 1, do Edgar Vasques). E se criaram nomes internacionais, como o Vasques e o premiadíssimo Santiago. Décadas depois, aqui está o Grifo n° 3, com artistas de muitas gerações, dos setentões a, novamente, a piazada de 20 e picos", escreveu o jornalista Paulo de Tarso Ricordi, em janeiro deste ano, em um texto para o site Terapia Política.
Edgar Vasques, um dos mais conhecidos e respeitados cartunistas do país, lembra dos tempos sombrios da ditadura. "Nós começamos a trabalhar de baixo de mau tempo, em plena ditadura militar e depois do AI5. Eu tenho 53 anos de desenho profissional. Neste tempo todo, mantivemos uma postura de usar o humor como uma linguagem política", relembrou Vasques. Ele contou que o objetivo da fundação da Grafar era reunir as gerações de grafistas, pessoas que trabalham na arte aplicada, ao jornalismo, edição, ilustração, imprensa e agora, mais recentemente, às redes sociais, e que produziam charges, caricaturas, quadrinhos, ilustrações, vinhetas, capas de discos, estamparia, entre outras coisas. "Tudo isso faz parte do nosso território. Fundamos a associação para reunir pessoas brilhantes e que não tinham interlocução com as novas gerações. Nós, naquela época iniciando nesta arte, não tínhamos acesso ao trabalho de profissionais conceituados como o São Paulo, Sampaio, Joaquim da Fonseca e outros grandes ilustradores, cartunistas, chargistas. As obras iam para algum museu, isso quando iam, e as novas gerações tinham que começar do zero", explicou o criador do Rango, um dos personagens mais famosos de Edgar Vasques.
"Meu pai era amigo do São Paulo e do seu irmão Sampaio. Por conta disso, eu tinha interlocução com eles. A partir daí comecei a me dar conta da necessidade de ter acesso ao trabalho que eles tinham produzido e que devia ser passado para os mais jovens, como eu", lembra. Vasques explicou que essa relação foi uma espécie de fio condutor para a fundação da Grafar, não somente para a velha geração dos anos 70, mas também pela capacidade que teve de agregar novos cartunistas que foram chegando. "O Guaraci Fraga foi quem me puxou para fazer isso na Folha da Manhã, que era um jornal que tinha uma direção esclarecida, com pessoas como Elmar Bones, Ruy Carlos Ostermann, entre outros, e que compreenderam a importância daquele momento do comentário gráfico crítico. Eles que abriram espaço para uma leva de novos e muitos deles estão aqui hoje", relembrou.
Bier é um destes cartunistas que surgiram nesta entressafra ainda com resquícios da ditadura militar. "A proposta do Grifo mexeu de tal maneira comigo que eu comecei a produzir além de charges, aforisma e trocadilhos, e isso me deixou muito feliz. Meu trabalho está em uma vitrina. Eu lembro, quando cheguei na Folha da Manhã, que o Edgar e Fraga me receberam, em 1975, e eu já tinha começado a publicar em Santo Ângelo, onde fui levado certa vez para um interrogatório policial, sendo naquela época menor de idade", relembrou Bier, acrescentando que em 1976 a ditadura também fechou a Folha da Manhã. Celso Schroder lembra que o "Diabo Rosa" é uma coluna pensada, editada, diagramada e completamente feita pelo Bier e, na minha opinião é a melhor coluna surgida nos últimos tempos. Lembra muito a "Gip Gip, Nheco Nheco", do Pasquim, coluna do Ivan Lessa, que era ilustrada pelo Redi. "É uma coluna inspiradora e feita pelo Bier, esse guri que morava perto da minha casa, em Santo Ângelo, e eu nem sabia que existia", diz Schröder.
PASQUIM COMO REFERÊNCIA
O projeto que deu origem ao Pasquim nasceu no fim de 1968, após uma reunião entre o cartunista Jaguar e os jornalistas Tarso de Castro e Sérgio Cabral, que estavam à procura de uma opção para substituir o tabloide humorístico A Carapuça, editado pelo recém-falecido escritor Sérgio Porto. Assim nasceu o mais conhecido semanário alternativo brasileiro, referenciado pela oposição à ditadura militar e pelo humor contestador e ácido que levou os governos autoritários à "loucura". A primeira edição foi publicada em 22 de junho de 1969 e com uma tiragem de 28 mil exemplares. Passados seis meses, a tiragem do Pasquim era de 250 mil. Além de um grupo fixo de jornalistas, que incluía Luiz Carlos Maciel, a publicação contava com a colaboração de nomes como Henfil, Paulo Francis, Ivan Lessa, Carlos Leonam e Sérgio Augusto. Também contava com colaboradores eventuais como o Ruy Castro e Fausto Wolff, além de figuras de destaque na imprensa brasileira, como Ziraldo, Millôr, Manoel "Ciribelli" Braga, Miguel Paiva, Prósperi, Claudius e Fortuna, que se juntaram ao time. O símbolo do jornal era o ratinho Sig (de Sigmund Freud), desenhado por Jaguar, baseado na anedota da época que dizia que "se Deus havia criado o sexo, Freud criou a sacanagem".
Em 1969, em função de uma entrevista polêmica feita pelo cartunista Jaguar e os jornalistas Tarso de Castro e Sérgio Cabral com a já notoriamente controversa atriz Leila Diniz, foi instaurada a censura prévia aos meios de comunicação no país, a Lei de Imprensa, que ficou popularmente conhecida pelo nome da atriz. Em novembro de 1970, a maior parte da redação de O Pasquim foi presa depois que o jornal publicou uma sátira do célebre quadro de Dom Pedro às margens do Ipiranga, (de autoria de Pedro Américo). Os militares esperavam que o semanário saísse de circulação e seus leitores perdessem o interesse, mas durante todo o período em que a equipe esteve encarcerada — até fevereiro de 1971 — O Pasquim foi mantido sob a editoria de Millôr Fernandes (que escapara à prisão), com colaborações de Chico Buarque, Antônio Callado, Rubem Fonseca, Odete Lara, Gláuber Rocha e diversos intelectuais cariocas. Na época, o pasquim vendia cerca de 100 mil exemplares por semana, quase todos em bancas, mais do que as revistas Veja e Manchete somadas.
As prisões continuariam nos anos seguintes, foi também alvo de dois atentados a bomba: o primeiro em março e o segundo em maio de 1970. Na década de 1980, as bancas que vendiam jornais alternativos como O Pasquim passaram a ser alvo de atentados mais sistemáticos. Aproximadamente metade dos pontos de venda decidiu não mais repassar a publicação, temendo ameaças. Era o início do fim para o Pasquim. O jornal ainda sobreviveria à abertura política de 1985, mesmo com o surgimento de inúmeros jornais de oposição e de novos conceitos de humor (Hubert, Reinaldo e Cláudio Paiva, egressos de O Pasquim, fundaram O Planeta Diário). Graças aos esforços de Jaguar, o único da equipe original a permanecer em O Pasquim, o semanário continuaria ativo até a década de 1990. No carnaval carioca de 1990 toda a equipe de O Pasquim foi homenageada pela escola de samba Acadêmicos de Santa Cruz com o enredo "Os Heróis da Resistência". A última edição, de número 1 072, foi publicada em 11 de novembro de 1991.
FIGURA MITOLÓGICA
O grifo é uma criatura mitológica, uma mistura de leão e águia. Possui corpo de leão, mas tem cabeça, garras e é capaz de voar como uma águia, sendo talvez a criatura voadora mais rápida de Arton. Possui pelos grossos, presas e garras, é capaz de enxergar no escuro e é um predador feroz quando dá o bote em suas presas. Os grifos não existem no Reinado, mas são muito comuns nas Montanhas Sanguinárias e outras áreas montanhosas. Eles muitas vezes podem ter boas relações com os humanos. Em Triunphus, eles são a montaria dos melhores soldados da Guarda da Fênix; nas Sanguinárias, uma comunidade de grifos do Lugar da União vivia em conjunto com uma tribo de bárbaros, unindo filhote a criança na infância em um companheirismo que duraria o resto de suas vidas - até a aldeia ser destruída pelo Dragão-de-Aço.
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