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Foto do escritorAlexandre Costa

Gênesis 5: a versão mais que verdadeira - Samaritana, por Paulo Gaiger*

Recentemente tornaram-se publicas as descobertas no sítio arqueológico Serrote do Letreiro, também conhecido como o Vale dos Dinossauros, na cidade de Souza, na Paraíba. Os povos pré-coloniais admiraram as pegadas e os fósseis dos terópodes, saurópodes e ornitópodes, e os pintaram nas pedras junto com a frase “Vai te catar, Musk”. Cientistas brasileiros e do mundo todo estão maravilhados com as descobertas. No entanto, para desespero de alguns, a Intercept Paraibana flagrou um documento que os cientistas cabras machos estavam a ocultar: mais uma carta da Eva, nossa primeira exilada, escritora e protagonista. Vamos a ela e, assim, entenderemos a razão da ocultação: “Estou aqui neste sertão árido que até lembra um pouco as terras desérticas por onde tanta areia andei. Que andança! Morro de saudades de Jesus, assassinado brutalmente, ele e mais uma centena. Consegui escapar da ira dos homens, sejam cristãos ou não. Ser mulher é a questão e o problema. Que o diga a mãe de Jesus, que teve que dar-se fuga e desaparecer. Minhas outras amigas, as que não foram mortas, tiveram que sumir ou fingir pra elas mesmas uma conversão e aceitação das sujeições. Estou aqui, sentada sobre uma pegada de dinossauro, diz minha amiga Violeta. Escrevo e escrevo como posso. Violeta me auxilia. Sororidade já existe neste tempo, no sertão e em Jerusalém. Sabe, digo a Violeta, escrevi muitas das parábolas que meu companheiro contava para as pessoas e, às vezes, para multidões. Tem uma passagem com duas mulheres, Marta e Maria. Maria se põe a ouvir Jesus e Marta vai cuidar das coisas da casa. Naquele lugar, e pelos ditames do judaísmo, mulher nenhuma poderia ficar de blábláblá com um homem, ainda mais sendo um estranho. Marta não ficou com Jesus não porque não dava importância, mas porque poderia ser apedrejada. Maria era uma jovem menina. Aí entrei eu. Falei com Jesus e disse a ele que considerasse a realidade das mulheres, bem diferente da dos homens. Falei com Maria e com Marta e lhes assegurei que iria ficar junto na conversa. Assim foi feito. No final, ganhamos duas mulheres para o grupo, duas parceiras. Jesus emocionado, me agradeceu. Tem outra, de que eu gosto bastante, mas que oralmente, como esta que contei, sofreu mudanças nada legais. A da boa samaritana. Escrevi uma história em que uma mulher era assaltada, surrada e estuprada, deixada à beira da estrada sangrando e em frangalhos. Passaram um sacerdote, um levita e, depois, um discípulo de Jesus e fizeram de conta que não a viram. Afinal, era uma mulher. Finalmente, uma mulher, supreendentemente, samaritana e sozinha, viu a mulher agredida e não fez por menos: tratou suas feridas e a levou até uma hospedaria assumindo os gastos com os poucos recursos de que dispunha. O dono da hospedaria, surpreso, comentou: mas você é samaritana e mulher? Por que ajudar essa outra que é, inclusive, de outra religião? Porque ela é uma mulher como eu, porque ela é um ser humano como nós, porque não tem sentido ter uma ou qualquer religião se for para convencer, discriminar e separar, respondeu a samaritana. A mulher violentada acabou falecendo. Seus algozes foram presos, mas em minha história, 129 homens, entre Herodianos, Saduceus e Fariseus fizeram de tudo para soltar os assassinos... Tive que interromper minha escrita. Tive que seguir. Violeta me protegeu, deteve meus perseguidores com poesia. Resvalei por uma fenda. E lá fui eu, pela imensidão do mar. Pensei: vou te fazer um pedido, tempo, tempo, tempo, tempo...”

 

(*) Conto publicado no livro Metáfora das Flores


Gênesis 2 – O Jardim do Éden

Gênesis 3 – Abraâmicas

Gênesis 4 – Magdala

(*) Conto publicado no livro Metáfora das Flores





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