(*) Juliana Botelho Foernges e Jorge Branco
“Portanto, a biblioteca não podia ser ameaçada por nenhuma força terrena, pois era uma coisa viva…
Mas se era viva, por que não deveria abrir-se ao risco do conhecimento?”
Umberto Eco, O nome da rosa.
Estranho tempo este no qual vivemos. Esse tempo, decididamente, deve nos impelir a abandonar o pensamento linear, fundado nas escolas cartesianas e positivistas da interpretação social. Não são leis transcendentais que regem a dinâmica da sociedade, tampouco o evolucionismo linear nos faria crer (sim crer, pois estaria fundamentado no campo das crenças e não no das evidências) em um avanço inexorável, quase natural, da sociedade.
São as violentas lutas pela dominação política, com a imposição da supremacia de uma razão de mundo sobre outra, que produzem a história. Não uma evolução retilínea, mas uma mastigação contraditória de valores e crenças, hierarquias e poder – ora destruídos ora atualizados mas sempre transformados – que gera a legitimação suficiente para que uma classe social possa vir a convencer as demais de que seus interesses e paixões são as verdades absolutas. O que não passa de particular é tornado universal por força da hegemonia.
A narração linear nos leva a acreditar que a Renascença e a modernidade seriam a superação absoluta do pensamento medieval. Os ideais da nova classe ascendente, a burguesia, teriam deixado para trás o pensamento de Santo Agostinho da condenação da ânsia por dinheiro e bens materiais. O racionalismo teria subjugado o conhecimento tradicional e a ciência tomando o lugar da fé. Assim, estaria aberto o caminho para o reconhecimento e efetivação da igualdade entre os indivíduos. A dinâmica do capitalismo fez ruir tal esquema argumentativo. A tendência concentracionista do capital e a necessidade incessante de manutenção das grandes taxas de lucro impuseram uma realidade de crises sucessivas e permanentes e com ela a necessidade, cada vez mais exasperada, de se manter a ordem. O que somente pode ser feito através de um processo constante de legitimação da dominação, de convencimento de que o mundo é de oportunidades iguais e que pobreza e exploração são naturalmente circunstanciais.
Assim, a versão passa a ser bem mais relevante do que os fatos e a história contada passa a ser mais convincente do que a história vivida. Basta para isto que se controle os mecanismos de seleção da narração e os mecanismos de convencimento. A dinâmica da atualidade é marcada pela implosão dos consensos racionais e uma ressurreição dos valores tradicionais, porém, não em oposição aos valores da dominação capitalista, mas, bem ao contrário, à serviço dela.
Sob certos aspectos, a hegemonia neoliberal do século XXI parece ter devolvido o mundo capitalista aos seus primórdios no século XIX. A tendência estrutural ao monopólio e à hiperconcentração de capital levou as frações dirigentes da burguesia a uma associação inevitável com os setores mais anti-humanistas, neofascistas e autoritários do próprio capitalismo e de suas elites políticas. As políticas desta fração dirigente arrastaram o mundo a uma já prolongada crise da economia, iniciada em 2007/08. Essa crise tem com resultado uma corrosão acelerada da indústria e um declínio enorme do emprego regulado e protegido. Somente os grandes proprietários de capital tiveram lucros de grande porte neste período, contudo determinados setores da burguesia, periféricos e da baixa densidade tecnológica tais como as grandes redes de comércio, também puderam manter altas taxas de lucros com base neste hiper depreciação a que o trabalho foi submetido. As falências, o desemprego e o aumento do trabalho precário atestam a dinâmica de hiperconcentração de riqueza em todo o globo.
Em 1962 Friedrich Hayek, o teórico basilar do que se chama neoliberalismo, escreveu uma carta a António Salazar, então ditador em Portugal com fortes simpatias fascistas, que sua iniciativa de presenteá-lo com seu livro “The Constitution of Liberty” seria para o ajudar “na sua tarefa de desenhar uma Constituição que previna os abusos da democracia”[1]. Uma recomendação com uma objetividade próxima da rudeza. Hayek já havia desenhado teoricamente a incongruência entre neoliberalismo e distribuição de riqueza e, nesse sentido, previsto as dificuldades as quais um sistema democrático liberal poderia criar caso os trabalhadores ascendessem à um nível médio que fosse de ganhos sociais e organização política.
A hegemonia neoliberal do modo de produção capitalista levou o mundo à tendência estrutural ao monopólio e à hiperconcentração de capital. Para isto, suas frações dirigentes caminharam a uma associação inevitável com os setores mais anti-humanistas, neofascistas e autoritários do próprio capitalismo e de suas elites políticas. O custo político da tarefa de super expropriar a classe trabalhadora, lhe retirando direitos trabalhistas e programas estatais de compensação social, fatalmente não poderia ser suportado em um ambiente de superioridade cultural de valores democráticos e política de partidos de centro esquerda ou, muito menos, de esquerda.
O mergulho neste modelo econômico ultraconcentrador, que exige cada vez mais medidas de esbulho dos mais pobres, levou à associação orgânica desta fração dirigente da burguesia rentista com o autoritarismo. O que Nancy Fraser (2018) caracteriza como neoliberalismo ultrarreacionário. Suas características seriam o aprofundamento, no plano da distribuição da concentração de riqueza e poder, e secundarização e até supressão de protagonismo e espaço político dos setores não rentistas e de políticas progressistas, liberais clássicas e classistas no campo do reconhecimento e da legitimação política. Através de governos, partidos e frentes neofascistas se implantaram as políticas de expropriação do valor do trabalho, como as reformas trabalhista e previdenciária. Evidentemente isto não seria possível, em uma estratégia de conquista de maioria, sem que houvesse um papel decisivo dos aparelhos de hegemonia, como os meios de comunicação, igrejas fundamentalistas, o sistema de justiça e maiorias parlamentares, na sustentação política desta emergência reacionária.
Neste contexto que o mundo enfrenta uma verdadeira pandemia de autoritarismo, pesadelo que muitos acreditavam havia sido superado pela social-democracia do pós-guerra e pela “onda” de independências e regimes pós-autoritários na África e na América. Israel, é um caso paradigmático onde o instável e deslegitimado e derrotado governo do Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu havia fechado o parlamento e os tribunais israelenses em um claro passo adiante na ideia de desdemocratização e autoritarismo em emergência no mundo. As situações autoritárias se repetem na Hungria de Viktor Orban, na Bulgária de Boyko Borisov, nas Filipinas de Rodrigo Duterte, entre outros arroubos da nova direita no mundo.
O fascismo, considerando todas as suas variantes, tornou-se uma corrente política muito ativa no mundo capitalista sob hegemonia neoliberal. O século XX nasceu sob a conjuntura de profundas crises. As revoluções proletárias na Europa, em especial na Rússia, tiveram como contraponto a emergência de inúmeras contrarrevoluções lideradas por organizações fascistas. O fascismo italiano e o alemão, seguidos por suas variantes portuguesa, espanhola, húngara e romena – para citar as mais relevantes – criaram um bloco de defesa do capitalismo. A pergunta clássica “Seria o fascismo a forma autoritária e conservadora do Estado capitalista?” encontra sua dimensão empírica nestes casos históricos.
Uma das dimensões mais relevantes do fascismo é seu sentido corporativo e particularista. As diferentes correntes do fascismo convergem na política de eliminação e ódio à ideia de pluralidade e diversidade social. Fascismo é contrário à ideia de humanidade, se movimenta no sentido antagônico ao conceito de universal. Somente reconhece e valoriza sua comunidade, o seu particular. Assenta-se nos axiomas da superioridade da comunidade sobre a humanidade, do particular como superior ao universal.
Esta foi a base do programa de eliminação física e cultural da população judia na Europa durante o governo nazista na Alemanha entre 1933 e 1945, o Holocausto que assassinou mais de 6 milhões de pessoas. Como também da guerra total levada a cabo contra povos eslavos e ciganos e contra comunistas, no mesmo dilacerado momento. Da mesma forma em relação ao extermínio promovido pelo governo italiano na Abissínia, África, nas décadas de 1920 e 1930. Vilanias que expressam os delírios colonialistas e de supremacia étnica do fascismo.
O fascismo é efetivamente uma experiência histórica, objetiva e concreta. Como experiência é constituída de conceitos e de uma estética. Contudo, a relação entre palavras e coisas é complexa. Uma mesma palavra pode reunir mais de um significado. Mas há um sentido comum que permite distinguir e definir fascismo. São movimentos políticos de extrema direita que se caracterizam por seu sentido anticomunista: a devoção a um líder (quase sempre um imbecil perigoso) e o desprezo ao pensamento liberal democrático, sem deixar de ser pró-capitalista. São movimentos políticos que emergem nos períodos graves de crise capitalista para garantir a manutenção deste modo de produção. Se alçam à condição de fração dirigente em contrapartida a garantir o lucro do grande capital em tempos difíceis para tal objetivo.
O fascismo emerge, via de regra, como contragolpe ao crescimento dos movimentos operários, aos movimentos socialistas e, até mesmo, ao avanço do Estado social. Trata-se de uma resposta extremamente particularista ao sentido universalista das lutas democráticas e igualitaristas do século XX e XXI. Antes de mais nada, o fascismo é um ativismo militante contra a perda de privilégios e status dos de cima e o avanço econômico e fundamentalmente político dos de baixo. Mesmo num status subalterno, como no caso dos países periféricos onde suas elites econômicas e sua classe média são altamente dependentes, o fascismo é uma estratégia de uma luta pela manutenção da ordem hegemônica.
Nestes casos, há uma construção ideológica de criminalização e demonização da ideia de direitos e da democracia, ou seja, de responsabilizar miticamente a alteração da hierarquia tradicional, como o patriarcado e a superioridade étnica, pela pobreza, violência e desalento dos pobres no capitalismo em crise. Disso se alimenta o fascismo neste século XXI – uma decisiva vinculação aos valores neoliberais – o que lhe oportunizou uma nova apresentação estética, o que nos faz denominar de neofascismo.
Neste sentido que se cria a dimensão de adoração ao bizarro, ao grotesco e ao violento. A estética do bizarro, tão presente nas redes sociais nos casos de Bolsonaro e Trump, é a rejeição da estética da igualdade, chamada pejorativamente, mas paradoxalmente, pela extrema direita de “politicamente correto”. Ora, como se pode rejeitar algo que seja correto do ponto de vista político? Essa rejeição está baseada na defesa do tradicionalismo conservador. Na reposição de um passado hierárquico, totalmente segregacionista e pobre, como um passado idílico – historicamente inexistente – onde cada um “sabia o seu devido lugar”. Uma rejeição ao que seria uma anomia social causada pela ascensão da classe trabalhadora. Lembrem-se das lamentações que circulavam nas redes sobre o fato de muitos trabalhadores passarem a andar de avião, o que teria transformado os aeroportos, lugar da elite, em rodoviárias, lugar do povo.
A estética do fascismo é a organização racional do esforço para fazer retroceder a história, um “voltar para trás”. Obviamente, essa restauração é impossível. Como a história da humanidade é a história da luta de classes, simplesmente restaurar torna-se um ativo ideológico, através do qual se organiza uma grande fatia da classe trabalhadora desgastada pelo desalento, e não uma possibilidade histórica. A hegemonia neoliberal e a ideologia neofascista transformam o algoz em herói. Transformam os avanços civilizatórios dos direitos humanos e da igualdade em responsáveis pelo desmoronamento das condições de vida e das esperanças.
Deste modo assistimos o surgimento de uma extrema direita com novos contornos, atualizada, que funde o obscurantismo medieval com os valores da meritocracia e individualismo do capitalismo neoliberal. O culto da tradição, antes rejeitada, agora se vê associado ao culto da modernidade. A defesa do neoliberalismo se associa à defesa da família aristocrática, à supremacia racial e ao culto à autoridade e ao chefe. A valorização do sucesso individual se associa à rejeição da igualdade e à rejeição da ideia de direitos. De forma geral, se associa a refutação sobre qualquer sentido de correção social do mercado.
O fascismo do século XXI encontrou seu espaço político em uma espécie de ‘prestação de serviços” ao neoliberalismo, de garantidor, a manu militari se for preciso, da estabilidade do governo do capital. Para isso, teve que tecer uma rede intricada de valores reacionários assentada no culto à tradição, no combate ao racionalismo e na construção do inimigo entrelaçados com a afirmação de valores da igualdade normativa e da liberdade selvagem do mercado. (TEITELBAUN, 2020) Com esta gramática, o neofascismo oferece uma aparência de ordenamento social, uma explicação sobre a realidade, à uma sociedade dilacerada pela miséria. O resultado da aceitação desta gramática é a naturalização dos valores do individualismo, da falsa igualdade de oportunidades e da justeza do mérito e, por consequência trágica, a miséria passa a ser culpa do próprio demérito daquele indivíduo menos preparado ou afortunado.
A crise das migrações, o desemprego endêmico, o uso continuado da guerra e a pandemia da Covid-19 são tratadas como criação do inimigo, como um fato inventado, derivado não de relações de exploração em uma sociedade autoritária mas pelo desajuste criado por aqueles que querem acabar com a tradição e a hierarquia e as tentativas de combater tais misérias, um esforço de ditadores (sic) que querem eliminar a liberdade dos indivíduos. Um experimento miserável de anarco-liberalismo com chefe.
Nessa sua recriação pós-moderna, o fascismo se distingue de muitas de suas versões raiz do início do século XX. Para o neofascismo, o conhecimento, a igualdade, a liberdade e a imaginação são assim criminalizados em sustentação de um modo de produção que, através de seus intelectuais, se auto descreveu como a superioridade da razão. Entretanto, a fim de se manter, rompeu com seus fundamentos iluministas e associou-se ao mais obscuro medievalismo. A esses traços que Umberto Eco (2018) chama de “fascismo eterno” ou “ur-fascismo”. Trata-se de uma federação paradoxal de grandes dogmas antimodernos com a forma superior dessa própria modernidade.
Os grandes rentistas querem manter suas taxas de lucro e seus governos títeres, como Bolsonaro, farão o serviço de proteger os lucros e o capital destes setores. O que somente pode ser efetivado com apoio do oligopólio privado da mídia que tenta apresentar a “estabilidade das bolsas de valores e proteção aos investimentos” como soluções para o conjunto da população. Não é.
Na dimensão estrutural, as grandes questões que emergem são: está o capitalismo em uma crise terminal ou em um fim de ciclo crítico; se ambas convergem e interagem, criando as condições suficientes e necessárias para um novo modo de produção na economia; ou se trata de uma reorganização do capital em suas crises cíclicas? Aquilo que Krondratiev (1992) chamou de teoria dos ciclos longos. Já na dimensão conjuntural, é procurar saber se há uma crise de estabilidade e legitimidade do bloco no poder e qual será seu substituto.
Não há resposta conclusiva possível a estas questões enquanto vivermos a própria crise, mas é necessário nos movermos de forma ativa para evitar que sua consequência seja um cataclismo social, econômico, democrático e ambiental. É hora portando do ativismo em defesa de um modelo alternativo de economia e de recuperação de direitos fundamentais, de defesa de valores igualitaristas e das prerrogativas democráticas, de construção de um novo Estado social em superação ao Estado neoliberal.
No Brasil estes elementos estão presentes em um quadro de uma verdadeira guerra dos mundos. Os dois grandes períodos autoritários do capitalismo brasileiro, o Estado Novo dos anos 1930 e a Ditadura Militar de 1964 -1984 se marcaram como formas de modernização autoritária. Em um processo de revolução passiva, o ingresso do Brasil no capitalismo da Era Vargas e sua modernização na Ditadura Militar não se deram com o rompimento dos elementos autoritários dos períodos anteriores. Ao contrário, a tradição autoritária, assentada no regime de apropriação privada da terra, na ausência de relações de solidariedade social e na reorganização quase forçada da economia e da força de trabalho, foi a base dessa modernização. Os antigos monocultores da economia primário-exportadora foram superados como classe, mas não eliminados como fração política. Se transformaram nos novos capitalistas, subalternos, da economia industrial brasileira. O fascismo ainda que encontrasse condições para sua existência no Brasil do século XX, dadas as condições de transição para a economia capitalista moderna, tinha sua capacidade de liderança política restringida pelo protagonismo de outros campos políticos de direita e extrema direita, como os militares e as oligarquias tradicionais. (TRINDADE, 2016)
A despeito da presença contínua de expressões fascistas ao longo do século XX no Brasil, é na atualidade que o fascismo assume uma dimensão de poder que ainda não havia protagonizado. Superada a transição autoritária para a modernidade capitalista do século XX, as classes dominantes brasileiras entraram definitivamente na esfera da hegemonia neoliberal. Esse é um elemento decisivo para compreender a emergências desta nova manifestação do fascismo no Brasil. Assume o papel que antes fora de setores médios que entretanto conferiam algum grau de progressividade. Esta nova liderança fascista é radicalmente reacionária e se apresenta ao neoliberalismo com disposição e capacidade singular para implantar uma política de combate ao progressismo se utilizando de elementos ultraconservadores da cultura política brasileira como o anticomunismo e o fundamentalismo religioso. O que é feito através desta estética antimodernidade, antiuniversalidade. Sua condescendência com os novos esquadrões da morte, as milícias, o incentivo à violência policial como afirmação corporativa e o anticomunismo tomado como patriotismo é transformado em uma estética de antissistema, o famoso “contra tudo que está aí”. Este sentido de crítica reacionária ao sistema e à modernidade que estabelece as pontes do neofascismo com os trabalhadores empobrecidos, no Brasil e no mundo, exauridos por uma política de retiradas de direitos e proteção sócia que impôs aos trabalhadores uma dinâmica de instabilidade e desalento profundo, mas envolvidos, majoritariamente, em uma cultura tradicional, religiosa e conservadora. (SCHWARCZ, 2019)
É certo que esta nova direita, de cunho fascista e fundamentalista, já era existente antes da emergência da candidatura Bolsonaro e sua vitória nas eleições presidenciais de 2028. Estava, entretanto, fragmentada, acuada e isolada. Se manifestava sem que à ela fosse dada a devida relevância. Se articulou com o discurso liberal, contrário às políticas sociais. Se aproximou de amplas parcelas do empresariado através de seu discurso anticomunista, que na verdade servia de legitimação para um discurso contrário ao Estado social, aos direitos fundamentais e aos sistemas protetivos, como o trabalhista, o previdenciário, assistência social, a educação e o de saúde.
Faltava, contudo, um fator político que desse organicidade à essa nova direita neofascista. Esse papel passou a ser, diligentemente, cumprido pelo governo Bolsonaro. Este que dá forma final a esse partido-tropa, aglutina e confere programa e voz à nova direita antes fragmentada. A relevância política de Bolsonaro está baseada na emergência de uma nova direita, mobilizada, ideologizada e politizada, que reúne um conjunto social de ressentidos ideológicos que pensam ter perdidos direitos naturais baseados na supremacia racial, no patriarcado e nos valores culturais religiosos fundamentalistas e em uma camada de médios ricos que agem para tratar a pandemia como uma oportunidade de lucros e não uma crise humanitária.
Esse novo bloco neofacista, reacionário, desapercebidamente se formou caminhando nos corredores elites e setores médios ressentidos e burgueses em crise, alinhavando moinhos anticomunistas nas escolas militares e nas intactas comunidades de informação remanescentes da ditadura militar, sugerindo nexos entre retóricas fragmentadas de criminalização da política, armando plausíveis peças acusatórias contra os democratas e a esquerda. Não se pode, portanto, cair no erro do minimalismo e da desídia política, de achar que o sistema político corrigirá por si o que seria um eventual desvio conjuntural. O fascismo, em suas diversas vertentes, não é um ‘desvio do sistema”, é o próprio sistema em sua versão perfeita. Precisamos reconhecer, lamentável e finalmente, a carta de Hayek à Salazar foi lida no Brasil.
(*) Juliana Botelho Foernges é Advogada e Mestre em Ciência Política.
(*) Jorge Branco é Sociólogo e Mestre em Ciência Política.
Referências ECO, Humberto. O fascismo eterno. Rio de Janeiro: Record, 2018 FRASER, Nancy. Do neoliberalismo progressista a Trump e além. Política & Sociedade, v. 17, n. 40, p 43-64, 2018. KONDRATIEV, Nicolai. Los ciclos largos de la coyuntura economica. México D.F.: Unam, 1992. SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. TEITELBAUN, Benjamin R. Guerra pela eternidade. Campinas: Editora da Unicamp, 2020. TRINDADE, Hélgio. A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas. Porto Alegr [1] https://blogues.publico.pt/tudomenoseconomia/2014/09/02/tao-liberal-e-tao-amigo-de-salazar/