ENTIDADES SOCIAIS REPUDIAM ATAQUES RECORRENTES DO PRESIDENTE JAIR BOLSONARO À DEMOCRACIA DO BRASIL
- Alexandre Costa
- 16 de mai. de 2022
- 5 min de leitura

Os ataques sistemáticos do presidente Jair Bolsonaro (PL) à democracia e ao sistema eleitoral do país levaram entidades e organizações da sociedade civil a entregar uma carta de repúdio, neste segunda-feira (16/5), ao ministro Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O grupo considera “inadmissível” que Bolsonaro atue de “forma exatamente oposta a seus deveres jurídicos e institucionais, atacando de forma periódica, reiterada e sistemática o sistema eleitoral brasileiro, dirigindo-lhe críticas infundadas, dúvidas e afirmações desprovidas de respaldo técnico e racional”. As entidades afirmam que não vão aceitar a “condição de reféns de chantagens e ameaças de ruptura institucional”. O ministro recebeu o documento durante uma reunião com o grupo “Coalização para a Defesa do Sistema Eleitoral”, composto por entidades e organizações da sociedade civil, entre elas, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), a Coalizão Negra por Direitos e a ColetivA Mulheres Defensoras Públicas do Brasil. Além de reivindicar a abertura de uma investigação para apurar o uso de ferramentas de espionagem por parte do governo federal para “interferir na regularidade do processo eleitoral”, o grupo solicita à corte eleitoral a realização de uma “grande missão internacional de observadores eleitorais”, com experiência comprovada e nos moldes de experiências bem-sucedidas de outros países.
A carta faz referência aos ataques do presidente que, além de desacreditar o Brasil, têm como objetivo "gerar instabilidade institucional, disseminando a desconfiança da população brasileira e do mundo acerca da correção e regularidade das eleições brasileiras". “Tais agressões, bravatas e afirmações desprovidas de respaldo técnico, científico e moral, servem a um único propósito: o de gerar instabilidade institucional, disseminando a desconfiança da população brasileira e do mundo acerca da correção e regularidade das eleições brasileiras, e, por consequência, desacreditar o próprio país, como nação democrática, colocando em xeque a segurança jurídica, em momento especialmente delicado, em que se faz essencial a tranquilidade e a isenção de ânimos, para que o processo eleitoral transcorra sem sobressaltos ou mesmo atos de violência”, argumentam as entidades sociais na carta entregue ao ministro, Fachin.
Cabe lembrar que o próprio presidente Jair Bolsonaro admitiu, no ano passado, não dispor de provas relacionadas às acusações que faz contra o sistema eleitoral.
LEIA A ÍNTEGRA DA CARTA
Excelentíssimo Senhor Ministro
Edson Fachin
Presidente do Tribunal Superior Eleitoral - TSE
As entidades da sociedade civil abaixo listadas vêm à presença de V. Exª manifestar, inicialmente, sua indignação e repúdio em face dos constantes ataques que o senhor Presidente da República e seus seguidores vêm desferindo contra o processo eleitoral brasileiro, a Justiça Eleitoral e seus juízes e servidores. É inadmissível que o primeiro mandatário – ocupante do cargo que se situa na cúpula da estrutura hierárquica do Poder Executivo nacional e que, portanto, tem o dever de dirigir os rumos do país com serenidade e responsabilidade – valha-se de seu cargo, para atuar de forma exatamente oposta a seus deveres jurídicos e institucionais, atacando de forma periódica, reiterada e sistemática o sistema eleitoral brasileiro, dirigindo-lhe críticas infundadas, dúvidas e afirmações desprovidas de respaldo técnico e racional.
É isenta de dúvidas a forma como o Brasil vem, ao longo de décadas, aprimorando e fazendo evoluir seu sistema de votação e de apuração de votos. Esse sistema que, em todas as eleições realizadas, entregou seus resultados dentro da mais ampla transparência e lisura, foi, inclusive, o sistema que permitiu que o atual Presidente assumisse seu cargo e fosse diplomado, com mais de 50 milhões de votos, nas últimas eleições.
Tais agressões, bravatas e afirmações desprovidas de respaldo técnico, científico e moral, servem a um único propósito: o de gerar instabilidade institucional, disseminando a desconfiança da população brasileira e do mundo acerca da correção e regularidade das eleições brasileiras, e, por consequência, desacreditar o próprio país, como nação democrática, colocando em xeque a segurança jurídica, em momento especialmente delicado, em que se faz essencial a tranquilidade e a isenção de ânimos, para que o processo eleitoral transcorra sem sobressaltos ou mesmo atos de violência. Tal necessidade se atrela não apenas à vida democrática e institucional do povo brasileiro, mas igualmente à sua imagem e reputação no cenário internacional, em que a segurança jurídica é condição primeira para a construção de um clima de confiança, no qual o desenvolvimento social, econômico e político do país possa ser retomado.
Não aceitamos a condição de reféns de chantagens e ameaças de ruptura institucional após pouco mais de três décadas em que a normalidade democrática foi restabelecida em nosso país, com o custo de muitas vidas, sofrimentos, privações e lutas.
Nessa medida, manifestamos a V. Exa. nossa solidariedade, em face dos ataques que as instituições da justiça eleitoral vêm sofrendo de forma reiterada e sistemática. Também registramos nossa preocupação com a utilização indevida, pelo Governo Federal, de instrumentos tecnológicos de espionagem e inteligência artificial, tais como o Pégasus, DarkMatter e o Córtex com a finalidade de obtenção de informações sigilosas, ao arrepio da legalidade, com a finalidade de interferir no processo eleitoral.
Nessa preocupante conjuntura, organizadas em forma de “Coalização para a Defesa do Sistema Eleitoral”, as organizações e entidades abaixo listadas comparecem à presença de V. Exa. para:
a) Reafirmar seu compromisso com a lisura e integridade do processo eleitoral e com as instituições da Justiça Eleitoral, b) Manifestar sua solidariedade em face dos ataques infundados que as instituições da justiça eleitoral vêm sofrendo sistematicamente;
c) Requerer a imediata abertura de edital de chamamento público para a composição de uma grande “Missão Internacional de Observadores Eleitorais”, com experiência comprovada em observações dessa natureza, nos moldes de experiências bem-sucedidas de outros países;
d) Que essa presidência solicite informações ao Poder Executivo e, se necessário, requisite a abertura de inquérito acerca do uso, pelo Governo Federal, de instrumentos tecnológicos de espionagem e de inteligência artificial, tais com o Pégasus, DarkMatter e Córtex, com a finalidade de obter informações sigilosas, de forma ilegal, e interferir na regularidade do processo eleitoral;
e) Reivindicar a efetividade das políticas afirmativas de acesso de grupos minoritários aos fundos eleitorais com o fito de incentivar a participação política de mulheres, povos indígenas e pessoas afrobrasileiras.
Na oportunidade, renovamos cordiais saudações democráticas.
Brasília (DF) 16 de maio de 2022.
Assinam o presente documento:
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB Associação Advogadas e Advogados Públicos para a Democracia - APD Associação Americana de Juristas - AAJ Associação Brasileira de Estudos do Trabalho - ABET Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD Associação de Juristas pela Democracia - AJURD Associação Juízes para a Democracia – AJD Associação Nacional dos Defensores Públicos - ANADEP Coalizão Negra por Direitos ColetivA Mulheres Defensoras Públicas do Brasil Coletivo Transforma MP Comissão Brasileira Justiça e Paz - CBJP Comissão Justiça e Paz de Brasília - CJP-DF Comissão Pastoral da Terra – CPT Federação Nacional dos Estudantes de Direito - FENED Fórum Social Mundial Justiça e Democracia - FSMJD Grupo Prerrogativas Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico - IBDU Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho - IPEATRA Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST Sindicato dos Advogados de São Paulo - SASP