CELI PINTO: CARTA AO PREFEITO DE PORTO ALEGRE
- Alexandre Costa

- 23 de mar. de 2021
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O Senhor não me conhece, permita que me apresente, sou apenas uma cidadã nascida em Porto Alegre. Vivi grande parte da minha vida aqui, vivo atualmente na cidade e tenho por ela um amor intenso. Por virtude ou vício, acompanho política nacional e internacional desde sempre. Nunca fui sua eleitora. Mesmo quando alguns poucos amigos se entusiasmaram com seu nome para fazer frente a Nelson Marchezan Junior, em 2016, eu não aderi, anulei meu voto pela primeira vez na vida. Nas últimas eleições, votei em Manuela d’Ávila nos dois turnos.
Mas eu lhe conheço de longa data, Senhor Prefeito. O senhor é bacharel em Direito, advogado, foi deputado pelo PMDB e vice-prefeito pelo mesmo partido. Portanto o senhor não é neófito em política, nem um elemento da laia do presidente da república (infelizmente não posso qualificá-lo como gostaria devido à Lei de Segurança Nacional). O senhor sempre mereceu respeito como político, em uma democracia temos adversários e isto é muito bom.
Mas o senhor está aderindo ao que há de mais desqualificado na política e – o que mais me impressiona – não é por desconhecimento ou por ignorância, mas por um senso de oportunidade nefasto que alguns chamariam de puro oportunismo. Darei três exemplos:
1. Na campanha eleitoral, o senhor foi para as regiões mais pobres e desassistidas de Porto Alegre dizendo que estava salvando a cidade do comunismo (veja youtube). Dizia que Manuela transformaria a cidade em um reduto comunista, stalinista e outras bobagens da mesma laia. Ora, Senhor Prefeito, até os minerais sabiam que isso não aconteceria. O senhor estava dizendo absurdos, sendo ridículo, mas assustava as pessoas mais desavisadas. Manuela era sua adversária e o senhor, em vez de criticar as suas propostas e apresentar as suas, decidiu caluniá-la. O senhor bolsonarizou. Chegou ao nível do ex-tenente.
2. Quando este senhor que preside o país veio a Porto Alegre inaugurar a nova ponte do Guaíba, o senhor estava lá. Tudo bem, o senhor, que é a mais alta autoridade da cidade, deveria achar que aquele era seu lugar. Muitos prefeitos e governadores não têm recebido o ex-tenente que provoca aglomerações. Mas o senhor foi, sem máscara (um bando de homens brancos, sem máscaras, abraçados, às gargalhadas)! Nesta oportunidade, o ex-tenente disse que a epidemia estava no finalzinho. E o senhor manteve um sorriso assustador, uma mistura de Ernesto Araujo com Olavo de Carvalho, enquanto fazia um V com os dedos. Se tiver coragem, olhe no youtube aquela cena, que parece saída de um filme que ironiza figuras patéticas do fascismo. Em seguida aprovou a cloroquina, que também o senhor sabe – como qualquer pessoa medianamente informada – ser um artifício criminoso de um governo federal irresponsável. O senhor, mais uma vez, bolsonarizou.
3. Agora estamos em um momento trágico da pandemia. O mais trágico de todos, desde março do ano passado, e o senhor está indo contra todas as recomendações médicas, contra todos os prefeitos e governadores , inclusive de seu partido. Certo, o senhor prometeu na campanha que não fecharia o comércio, mas mentiu muito, como já mencionei acima. Pelo menos agora, se não cumprir sua promessa, terá justificativas óbvias, humanitárias. Agora a situação é outra. Eu entendo perfeitamente o desespero dos pequenos comerciantes, dos empregados do setor de serviços. Mas a única forma de dar esperança a estas pessoas é adotar políticas públicas que os protejam. Para isso o senhor foi eleito, não para aproveitar-se do desespero alheio, apoiar buzinaços na frente de hospitais e a abertura do comércio e consequente lotação dos transportes coletivos. O senhor, em vez de honrar sua biografia, está novamente bolsonarizando.
Senhor Prefeito, esta é a Semana de Porto Alegre. Nós, porto-alegrenses, merecemos viver, aproveitar esta cidade tão especial! Pense em políticas públicas! Um prefeito não pode fazer tudo, mas pode fazer muito. O senhor está no limite de passar para a história como mais um genocida nesta triste quadra da história brasileira.
Atentamente
Céli Pinto
Uma cidadã porto-alegrense.
(*) Professora Emérita da UFRGS; Cientista Política; Professora convidada do PPG de História da UFRGS







