O Brasil contabilizava, em abril, 3.364 mortes registradas oficialmente pelas secretarias estaduais e repassados ao Ministério da Saúde. As mortes estavam diretamente ligadas à Covid-19. No entanto, o país também tinha outros 5.283 óbitos por Sras não-especificadas' ou 'em curso de investigação. As informações foram passadas por especialistas do Observatório Covid-19 BR ao jornal francês Le Monde. De acordo com reportagem da agência AFP, distribuída pela imprensa internacional, o Brasil parece condenado a se tornar o próximo epicentro da crise planetária do coronavírus, devido à velocidade do registro na propagação de novos casos e do número de vítimas fatais.
O sistema de saúde precário e a baixa adesão às medidas de isolamento social são, ao que tudo indica, as maiores causas do avanço da pandemia no país. Outra questão grave é o fato do Brasil ter adquirido testes de coronavírus pouco confiáveis. Um levantamento do Intercept, que cruzou dados de processos de liberação de testes no país com os de sistemas de vigilância sanitária de outros países, mostra que 75% dos reagentes para a verificação do vírus da covid-19 já autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, chegam ao Brasil sem a chancela internacional apropriada. Isso quer dizer que prefeituras, governos e empresas brasileiras estão comprando testes que não têm aval do controle sanitário dos países de origem para serem vendidos neles. Na última semana de abril, a Anvisa liberou a venda desses testes rápidos em drogarias, podendo ser adquiridos por qualquer pessoa.
"A questão não é saber se o Brasil será um dia o principal foco de contaminações no mundo: já é esse o caso", explicou Domingos Alves, do Laboratório de Informações sobre a Saúde da USP (Universidade de São Paulo) à agência francesa AFP . Segundo o grupo de pesquisa do qual ele faz parte o número de infectados no Brasil é 16 vezes maior ao número oficial e, portanto, deve estar perto 1,3 milhões de pessoas, mas isso não é confirmado justamente pela falta de testagem massiva para a covid-19. O jornal Le Monde adverte para o fato dos números de mortos no Brasil estarem defasados em relação aos que vêm sendo divulgado pelo Ministério da Saúde. A matéria do jornal francês mostra uma equação incompatível entre os dados oficiais de vítimas e o aumento do número de enterros em diversas cidades, como Fortaleza e São Paulo, que estão sendo obrigadas a abrir covas nos cemitérios para sepultar mortos que faleceram em decorrência da doença.
Recentemente, o jornal Zero Hora publicou matéria sobre a preocupação de países vizinhos com o crescente número de casos de coronavírus no Brasil e cita a afirmação do diretor de vigilância da saúde do Paraguai, Guillermo Sequera: "se o Brasil espirra, nós pegamos pneumonia". A crítica foi publicada na última sexta-feira (1/5), quando o Ministério da Saúde daquele país indicou que, dos 67 casos confirmados de covid-19 naquele dia, 63 eram de pessoas que vieram do Brasil. De acordo com o jornal, em março o Exército paraguaio já havia cavado, a pedido do governo, uma vala na principal rota de entrada para a cidade fronteiriça de Pedro Juan Caballero. A ideia é dificultar que pessoas vindas do Brasil a pé, via Ponta Porã (Mato Grosso do Sul), entrem por ali e circulem. A fronteira para veículos está fechada desde o início da quarentena no país, em 10 de março. Segundo ZH, o Paraguai tem 370 casos confirmados de covid-19 e 10 mortos, segundo dados do Ministério da Saúde, números muito mais baixos do que os registrados pelo Brasil — que tem mais de 101 mil infectados e 7.025 mortos até este domingo (3).
A Argentina também está atenta à fronteira aos casos provenientes do Brasil. Laureano Rodríguez, chefe de Redação do jornal Primera Edición, da cidade de Posadas, capital da província, informou à reportagem de ZH que "as notícias do aumento da doença no Brasil nos alarmam, porque somos uma das portas de entrada do país". Tanto em Misiones quanto no posto de fronteira mais movimentado entre Brasil e Argentina, o da cidade de Paso de los Libres, a temperatura de cada motorista de caminhão é checada, assim como a de repatriados por via terrestre. Em entrevista à imprensa local, o presidente argentino, Alberto Fernández, disse que o Brasil o preocupava muito:
— Principalmente o tráfego de caminhões que vêm de São Paulo, onde o nível de infecção é extremamente alto. Para mim, não parece que o governo brasileiro esteja levando a pandemia a sério. Isso me preocupa por causa do povo brasileiro e porque o vírus pode ser carregado para dentro da Argentina.