AUDIÊNCIA DE CONCESSÃO DO JARDIM BOTÂNICO TRAZ À TONA DENÚNCIAS DE ABANDONO E INTERESSES ECONÔMICOS
- Alexandre Costa
- 3 de fev. de 2022
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A notícia da realização da Audiência Pública sobre Concessão do Jardim Botânico de Porto Alegre, na manhã desta quinta-feira (3/2), gerou protestos, questionamentos e manifestações de repúdio, tanto nas redes sociais quanto de participantes que compareceram ao auditório do Centro Administrativo Fernando Ferrari ou de cidadãos que acompanharam o evento transmitido pela internet, no canal da Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão no Youtube.

O Jardim Botânico de Porto Alegre, localizado no bairro de mesmo nome, tem aproximadamente 36 hectares e, atualmente, conta com estrutura de laboratórios, gabinetes, salas de exposições e coleções científicas formando um acervo diversificado de exemplares de animais, plantas e fósseis que representam a biodiversidade nacional e internacional, com ênfase no Rio Grande do Sul. É considerado um dos cinco maiores jardins botânicos brasileiros.
A modelagem do projeto de concessão do Jardim Botânico de Porto Alegre ficou a cargo do BNDES, com o apoio do consórcio Araucárias e do Instituto Semeia. O trabalho teve a coordenação dos técnicos da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), Secretaria de Parcerias e Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão, com o acompanhamento jurídico da Procuradoria-Geral do Estado (PGE).
Enquanto o representante do BNDES, Pedro Bruno, explicava o projeto, tentando diferenciar o modelo de concessão de um processo privatização, o representante da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) e presidente da Associação dos Servidores da Secretaria do Estado de Meio Ambiente e Infraestrutura (Assema), Pablo Pereira, denunciava a falta de transparência e de participação da equipe técnica na iniciativa.
A proposta também foi questionada pelo biólogo e representante da Associação de Funcionários da Fundação Zoobotânica RS, Marco Azevedo, que alertou para o que diz a instrução normativa (IN) do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que prioriza o lazer, desde que alinhado com a finalidade prevista na mesma. “O projeto apresenta, de forma vaga, como serão os mecanismos de gestão do Jardim Botânico”, argumentou Azevedo.
Pelo Twitter, a deputada Juliana Brizola (PDT) criticou a iniciativa do governo de Eduardo Leite – que dá continuidade ao processo de privatização das fundações estaduais, iniciado no governo de José Ivo Sartori (PMDB) -, e declarou que “não bastasse privatizar a energia e a água, nem mesmo a fauna e a flora escapam da política de acabar com o patrimônio público”.
O modelo de concessão, que é diferente da privatização, pois não prevê a transferência de propriedade do ativo, prevê três pilares ligados à preservação ambiental, fomento ao turismo sustentável e a geração de renda e desenvolvimento regional. De acordo com Pedro Bruno, o evento foi uma oportunidade de esclarecer dúvidas sobre o projeto de concessão que poderá “ampliar o potencial de visitação do Jardim Botânico, mas que para isso precisa de novos investimentos”. O contrato prevê investimentos de mais de R$ 27 milhões ao longo de seis anos. A estimativa ao longo dos 30 anos da concessão é de R$ 239,7 milhões de investimento, que incluem custos pessoais, encargos e insumos, despesas operacionais, seguros, garantias e ressarcimentos, manutenção, entre outros. Em relação à geração de empregos diretos e indiretos, a iniciativa prevê 95 empregos diretos, com renda anual de R$ 5,4 milhões e 650 empregos indiretos, com renda anual de R$ 17,5 milhões. O projeto está em fase de análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e a previsão é de que o edital seja lançado no primeiro trimestre de 2022.
Todas as informações e documentos sobre o projeto de concessão do Jardim Botânico estão disponíveis no site do programa RS Parcerias.
JARDIM BOTÂNICO ESTÁ ABANDONADO No dia 1º de novembro do ano passado, o biólogo Paulo Brack, professor do departamento de Ecologia, do Instituto de Biociências da Ufrgs, e diretor do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá), denunciou a precarização do Jardim Botânico de Porto Alegre (JB), em matéria publicada pelo jornal Extra Classe, do Sindicato dos Professores do Ensino Privado – RS. “Os problemas estruturais e a dispensa de servidores ameaçam todo o patrimônio, desde os acervos até o terreno propriamente dito, cancelaram todas as bolsas de iniciação científica e, agora, estão querendo ceder uma área extra ao Ibama, não prevista inicialmente no acordo feito ano passado. Isso tudo, somado ao plano do Governo do Estado de repassar à iniciativa privada a gestão do JB e o risco que os Jardineiros, técnicos e pesquisadores ainda correm de serem demitidos, conforme a lei aprovada junto com a extinção da Fundação Zoobotânica,” explicou Brack, em matéria assinada pelo jornalista Cleber Dioni Tentardini.

Na época, Paulo Brack denunciou que o acervo estava ameaçado, que os bolsistas foram dispensados, que os laboratórios viraram depósitos e que a Sema pretendia conceder à iniciativa privada a gestão dos serviços no Jardim Botânico. Brack explicou que a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) contratou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para realizar estudos visando um edital de concessão. Também criticou o diretor-geral da Sema Marcelo Spilki e os estudos para indicar a viabilidade de repassar à iniciativa privada, por exemplo, a gestão da bilheteria, do estacionamento e de um novo restaurante no JB. E, ainda, a necessidade ou não de fazer readequações no Museu de Ciências Naturais para torná-lo mais interativo.
“Aquele é um local de conservação, não é para instalar um centro de eventos, como já tentaram anos atrás, e nem para cobrar caro o ingresso a fim de lucrar e, ao mesmo tempo, elitizar o perfil de frequentadores", argumento Brack, explicando que o Jardim Botânico é um centro de pesquisa e conservação da flora rio-grandense e um espaço de lazer dos gaúchos, e que ao longo dos anos, já perdeu mais da metade da sua área original. "Quando foi aberto, em 1958, a área do Jardim Botânico era de 81,5 hectares e hoje não passam de 36 hectares.
Ainda é considerado um dos cinco melhores do país e, além do arboreto, possui um banco sementes e um viveiro com produção de mudas inclusive de espécies raras, endêmicas (que se encontram apenas em uma determinada região) e ameaçadas de extinção. Hoje, existem no JB 140 espécies sob risco. PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DA FLORA Nesta quinta-feira, Paulo Brack criticou o projeto de modelagem do BNDES. "Nos dois maiores documentos para concessão, um sobre negócios e outro de arquitetura, ou mesmo em qualquer documento, fiz uma busca Controle +F e não encontrei NADA referente às palavras flora "ameaçada" ou "extinção". Flora tem 4 citações por cima. A palavra Consumo, no primeiro documento está citada 81 (oitenta e uma) vezes...Mercado e Negócios tem citações dezenas de vezes... Pra que serve um Jardim Botânico mesmo? Resolução Conama 339/2003!!! Ou é JB ou é parquinho de flores para desavisados deslumbrados consumidores pra tirar self com fundo ajardinado ...Tá okey? Uma audiência, "Pra não dizer que não falei de Flora", uma referência à música "Pra Não Dizer Que Não Falei de Flores", de Geral Vandré, que se tornou um hino de resistência à ditadura militar no Brasil (1964 a 1985).