"À vista de todos, o governo golpista destrói o Brasil. Aos poucos, o Brasil que tirou 34 milhões da miséria, que saiu do Mapa da Fome, que descobriu o pré-sal, que entrou no G8, que formou o BRICS, que se livrou do FMI vai se tornando tão pequeno, tão medíocre, tão vazio como Temer e Geddel", diz o colunista Marcelo Zero sobre o escândalo de corrupção que derrubou Geddel Vieira Lima e que ameaça a permanência de Michel Temer na presidência; "Um país de espigões e mesóclises de mau gosto".
À La Vue de tous, à vista de todos, o governo Temer, que nunca foi sólido, se desmancha no ar. Melhor: se desmancha na lama rasa do compadrio e da corrupção.
E pensar que Dilma, uma presidenta que até os piores adversários reconheciam ser honesta, foi apeada ilegalmente do poder para dar lugar a essa vara de suínos vorazes e fisiológicos. Alguém consegue imaginar Dilma pressionando um ministro para resolver, de forma irregular, a questão pessoal, menor, corrupta de outro ministro? Impossível. Geddel sequer teria tido coragem de chegar perto de Dilma com uma “reivindicação” desse tipo.
Mas, no governo Temer, tudo é permitido. E à vista de todos. O golpe escancarou o cinismo e a hipocrisia.
À vista de todos, o terceiro turno foi deflagrado por maus perdedores e o voto popular foi jogado na lata de lixo do golpismo mais escancarado. À vista de todos, inventaram uma nova interpretação das regras fiscais para poder enquadrar a presidenta honesta. À vista de todos, o grande operador da corrupção política nacional deu início ao processo de impeachment por vingança pessoal contra a presidenta que não o apoiou. À vista e aos ouvidos de todos, a presidenta honesta foi afastada para “estancar a sangria” dos corruptos e “restaurar a confiança” dos milionários operadores do mercado.
À vista de todos, sem pudor algum, o governo golpista compôs o novo ministério com as figuras mais abjetas da República. Todos homens brancos e ricos. Claramente brancos, suspeitamente ricos. À vista de todos, o governo ilegítimo pagou dezenas bilhões pelo apoio fisiológico ao golpe, ao mesmo tempo em que extinguia programas importantes para a população, como o Ciência sem Fronteiras.
À vista de todos, a mídia sonegadora de dinheiro público e da verdade, que antes perseguia implacavelmente o governo progressista, passou a apoiar, de modo cínico, a corja instalada no Planalto. Tornou-se cândida, como cândido foi o vestido da primeira-dama. Acostumada a apoiar golpes e a defender os interesses dos patrões abonados, essa mídia renovou a sua tradição de servir, com servilismo, aos desígnios dos governos reacionários. E à vista de todos.
À vista de todos, o governo golpista vende o pré-sal, nosso passaporte para o futuro, para o bem-estar futuro das multinacionais do petróleo, que adquirem essa riqueza a preço de banana. Décadas de pesquisa e esforço da Petrobras são doadas, de forma nobre, altruísta, a empresas estrangeiras que não têm reservas provadas de óleo. Perto disso, o espigão de Geddel não passa de ínfima farpa na dignidade nacional.
À vista de todos, o novo chanceler do governo ilegítimo nos faz também regredir mais de uma década em política externa, colocando o Brasil, de novo, na órbita estratégica dos EUA e enfraquecendo nossa participação no BRICS e no Mercosul. À vista de todos, aos olhos do mundo, o Brasil volta a ser um país pequeno, subserviente. Um país tão pequeno e tão medíocre como nossos “geddeis”. Um país de resplandecentes espigões em meio à pobreza mais sórdida.
À vista de todos, em jantares nababescos no Planalto, o governo ilegítimo articula e cimenta as medidas que recolocarão o Brasil no Mapa da Fome. Sem fazer economia, sem nenhuma austeridade pessoal, o governo Temer afunda a economia do país com medidas públicas de austeridade.
À vista de todos, certo de sua impunidade, o governo golpista articula golpe mortal contra a Constituição Cidadã e o Estado de Bem Estar. À vista de todos, a PEC 241/55 vai sacrificar os mais pobres no altar da austeridade para que sobre dinheiro público suficiente para pagar os juros devidos aos bancos e aos abonados que não pagam imposto. À vista de todos, e por 20 anos, saúde, educação, previdência, assistência social, etc. serão reduzidas e sucateadas em nome de uma “restauração da confiança” que nunca virá, de um crescimento que não ocorrerá, de forma sustentada, sem os investimentos do Estado. À vista de todos, crianças ficarão sem escolas, enfermos ficarão sem assistência e idosos morrerão sem aposentadorias. Mas os abonados não ficarão sem os generosos bônus dos maiores juros do mundo.
À vista de todos, a “ponte para o futuro” nos coloca no rumo decidido para um passado de desigualdade, exclusão, mediocridade e estagnação.
À vista de todos, a Casa Grande quer tirar os pobres do orçamento e mandá-los de volta à Senzala.
À vista de todos, cria-se um Estado de Exceção no Brasil. Juízes e procuradores partidarizados, à vista de todos e sob aplausos de todos, atropelam direitos e garantias individuais, com a desculpa do necessário combate à corrupção. Em nome desse combate, cometem a pior corrupção de todas: a corrupção da democracia, a decomposição politizada do republicanismo, o abastardamento das instituições democráticas. Em nome do combate a corrupção, destroem os núcleos estratégicos da economia e centenas de milhares de empregos de brasileiros inocentes.
Em nome da governabilidade, e à vista de todos, criminalizam estudantes que lutam pelo ameaçado futuro da educação brasileira. À vista de todos, estudantes perdem olhos, manifestações pacíficas são vítimas de operações de guerra, sedes de movimentos socais são invadidas à mão armada e a mera discordância volta a ser tratada como “traição”. Das trevas do passado ditatorial, voltam o lema “Brasil ame-o ou deixe-o” e os pedidos anacrônicos de intervenção militar. Parte do país está cega, louca.
À vista de todos, ou quase todos, que aplaudem a criminalização do caixa um, legal, do PT, prepare-se a anistia ilegal ao caixa dois dos partidos da base aliada.
À vista de todos, o Brasil retrocede à barbárie histórica, à pobreza abjeta, à desigualdade sórdida, ao autoritarismo mais grotesco e a um neoliberalismo falido em todo mundo. Nem mesmo o neofascista Trump acredita mais nessa agenda neoliberal fracassada que o governo golpista quer impor de novo ao Brasil.
O governo de Temer e Geddel é o último bastião da boçalidade global.
À vista de todos, o governo golpista destrói o Brasil. Aos poucos, o Brasil que tirou 34 milhões da miséria, que saiu do Mapa da Fome, que descobriu o pré-sal, que entrou no G8, que formou o BRICS, que se livrou do FMI vai se tornando tão pequeno, tão medíocre, tão vazio como Temer e Geddel.
Um país de espigões e mesóclises de mau gosto.
À vista de todos. À La Vue de tous. E sem nenhuma vergonha.
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