No ato da jornada nacional contra a mídia golpista, manifestantes fizeram oficina de cartazes que foram exibidos ao lado do prédio do Grupo RBS, em Porto Alegre.
O dia nacional de denúncia da mídia golpista, convocado pelas organizações que integram a Frente Brasil Popular, a Frente Povo Sem Medo, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Levante Popular da Juventude e outras entidades foi marcado, em Porto Alegre, por um ato público e um júri popular realizados ao lado do prédio do Grupo RBS, na esquina da Avenida Ipiranga com a Érico Veríssimo, e na frente do Teatro Renascença. O ato iniciou no final da tarde desta quinta-feira, com uma oficina de cartazes que foram sendo produzidos na frente do teatro e exibidos pelos manifestantes na sinaleira da esquina da Ipiranga com a Érico. “RBS Mente”, “O povo não esquece, abaixo a RBS”, “Globo golpista”, e “ZHelotes” foram algumas das palavras de ordem pintadas nos cartazes.
No início da noite, foi realizado um júri popular da mídia golpista, nas escadarias do Teatro Renascença. O jornalista Caio Venâncio lembrou o processo de outorga de concessões de canais de rádio e televisão em troca de apoio político e editorial que marcou o surgimento e expansão do Grupo RBS no Rio Grande do Sul. Além disso, denunciou a prática da propriedade cruzada de meios de comunicação que deu origem no Brasil a grandes corporações que controlam, ao mesmo tempo, um grande número de veículos de rádio, televisão, jornais e portais de internet.
O jornal Zero Hora ocupou o lugar da Última Hora, fechado pela ditadura por apoiar o governo constitucional de João Goulart. Três dias depois da publicação do Ato Institucional n° 5 (13 de dezembro de 1968), ZH publicou matéria sobre o assunto afirmando que “o governo federal vem recebendo a solidariedade e o apoio dos diversos setores da vida nacional”. No dia 1° de setembro de 1969, o jornal publicou um editorial intitulado “A preservação dos ideais”, exaltando a “autoridade e a irreversibilidade da Revolução”. A última frase editorial fala por si: “Os interesses nacionais devem ser preservados a qualquer preço e acima de tudo”.
“RBS Mente”, “O povo não esquece, abaixo a RBS”, “Globo golpista”, e “ZHelotes” foram algumas das palavras de ordem pintadas nos cartazes.
Os interesses nacionais, no caso, se confundiam com os interesses privados dos donos da empresa. A expansão do grupo se consolidou em 1970, quando foi criada a sigla RBS, de Rede Brasil Sul, inspirada nas três letras das gigantes estrangeiras de comunicação CBS, NBC e ABC. A partir das boas relações estabelecidas com os governos da ditadura militar e da ação articulada com a Rede Globo, a RBS foi conseguindo novas concessões e diversificando seus negócios.
Lucas Klein, do programa Correria e da Executiva Nacional de Estudantes de Comunicação (Enecos), afirmou que não haverá verdadeira democracia no Brasil com a presença de oligopólios de mídia controlando o sistema de produção e circulação de informações e opiniões no país. Lucas defendeu a intensificação da mobilização na sociedade em torno do projeto da Lei de Mídia Democrática, proposto pelo FNDC e por um conjunto de outras entidades da área da comunicação.
Diógenes de Oliveira lembrou a luta que trava contra a RBS desde 2001, quando denunciou a empresa por práticas de lavagem de dinheiro e sonegação fiscal durante depoimento prestado na CPI da Segurança Pública, durante o governo Olívio Dutra. Naquela época, segundo Diógenes, o grupo devia cerca de 212 milhões de reais, valor que, hoje, já estaria na casa dos 670 milhões de reais.
Em março deste ano, a Operação Zelotes denunciou um esquema de fraudes tributárias envolvendo grandes empresas brasileiras e multinacionais. As investigações foram conduzidas por uma força-tarefa formada pela Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público Federal e Corregedoria do Ministério da Fazenda. O Grupo RBS, a Gerdau, os bancos Bradesco, Santander, Safra, Pontual e Bank Boston, as montadoras Ford e Mitsubishi e um grupo de outras grandes empresas estão sendo investigadas pela suspeita de pagamento de propina a integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais para anular multas tributárias milionárias. Segundo as investigações, pelo menos 74 processos tributários podem ter sido fraudados, provocando um prejuízo de aproximadamente R$ 21,6 bilhões aos cofres públicos. Os casos que estão sob investigação teriam ocorrido entre os anos de 2005 e 2015.
No início da noite, foi realizado um júri popular da mídia golpista, nas escadarias do Teatro Renascença.
Celso Schröder, do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, assinalou que os atores do golpe em curso em 2016 contra o governo da presidenta Dilma Rousseff, são muito parecidos com os do golpe de 1964, inclusive em seus braços midiáticos. “A diferença é que, hoje, os canhões e tanques foram substituídos por dois anos de editoriais e matérias que sempre começavam com as palavras ‘Apesar da crise…’”. Além disso, acrescentou, a grande mídia brasileira tornou-se um foco de propagação de ideias racistas e homofóbicas, entre outras coisas. “A mídia está no centro do golpe em andamento. Mas nós temos força, com muita mobilização social, de evitar que esse golpe se sustente, derrubando Temer e quem mais for necessário”, afirmou Schröder.
O principal objetivo das manifestações realizadas em diversas cidades do país nesta quinta foi denunciar como o monopólio privado nas comunicações, representado principalmente pelas Organizações Globo, fere a democracia, a liberdade de expressão e o direito à comunicação. As entidades que organizaram a jornada divulgaram um manifesto onde apresentam suas razões para afirmar que o monopólio de comunicação é sinônimo de golpe. Segue a íntegra do texto:
Monopólio é golpe porque:
1- Não reflete nossa diversidade
No Brasil, apenas seis famílias controlam mais de 80% do setor de mídia. Isso faz com que diferentes visões de sociedade não se reflitam na programação das emissoras, prevalecendo um discurso único, o que viola o direito à comunicação e a liberdade de expressão do conjunto da população brasileira. Não é à toa que países com democracias consolidadas, como EUA, França, Inglaterra e Alemanha possuem mecanismos de regulação para impedir a formação de monopólios na comunicação e garantir pluralidade de vozes na mídia. O domínio da esfera pública midiática por uma única empresa, como no caso da Rede Globo, é destrutivo para qualquer ambiente democrático.
2- Desrespeita o interesse público
A mídia no Brasil é tratada como atividade privada com finalidade comercial, em que o interesse público fica em segundo lugar. Outro aspecto é a apropriação de emissoras de rádio e televisão por políticos com mandato eleitoral, uma prática que, além de ser inconstitucional, causa graves danos à nossa democracia, pois permite a perversa combinação entre poder político e controle da informação. Diferente de outros países, o sistema de emissoras públicas e comunitárias do Brasil sofre pela falta de investimentos, perseguição e sucateamento, inviabilizando a garantia de diversidade de conteúdo e de fontes de informação.
3- Deforma a opinião pública
A televisão e o rádio ainda são os meios de comunicação mais acessíveis ao conjunto da população brasileira e, por serem controlados por um verdadeiro monopólio, acabam contribuindo para a formação de uma opinião pública enviesada e parcial, o que influencia de maneira significativa os rumos do país, com impactos para todos, como ocorre agora no processo de impeachment.
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